Justiça
Ação para aproximar a justiça das pessoas mais vulneráveis
"Justiça na Favela" marcou o atendimento de diversos pelotenses para a resolução de problemas judiciais
Jô Folha -
Aproximar a comunidade dos seus direitos e oferecer informações básicas sobre temas judiciais à população em situação de vulnerabilidade social. O Dia da Justiça, comemorado ontem, foi marcado pela iniciativa "Justiça na Favela", com realização do Foro da Comarca de Pelotas em parceria com a Central Única das Favelas (Cufa) Pelotas. A ação resultou na prestação de serviço a cerca de 50 pessoas dos bairros Navegantes e São Gonçalo, que receberam, dentro da comunidade, atendimento nas áreas de Direito do Consumidor, da Família e andamento processual.
Semblantes de alívio não faltaram na manhã de ontem por parte daqueles que saíam com papeladas de uma igreja, na avenida Bento Gonçalves, próximo ao bairro Navegantes, local que serviu como posto para a intermediação de conflitos. Entraves judiciais, que em alguns casos já se estendiam por um longo tempo, puderam ser resolvidos através de uma parceria que perdura por anos entre a Cufa e o Foro.
Cheia de pressa, mas com sensação de menos um problema a resolver, a dona de casa Cássia Ribeiro ficou cerca de 40 minutos em conversa com uma das dez servidoras do Foro. Tempo longo para muitos, mas período suficiente para a resolução de um problema que se arrastou por um tempo: uma pensão de morte não cedida. "Sem palavras, o atendimento foi muito bom. É uma boa oportunidade a quem não pode ir até o Foro, pagar um advogado ou se locomover", relata.
Este foi o primeiro evento promovido pela Comarca de Pelotas dentro de uma das comunidades mais carentes da cidade. Conforme ressalta o juiz de Direito, Marcelo Malizia Cabral, anualmente na data comemorativa ocorre algum tipo de atendimento à população, mas esta foi a primeira oportunidade de contato diretamente com a população vulnerável. "A justiça é um serviço público, a gente tem que estar perto de quem precisa. A justiça é um instrumento para as pessoas terem acesso aos seus direitos", observa. Ele ressalta ainda que a ideia é desmistificar a justiça como inacessível e romper o paradigma de que ela não é para todos, independentemente da classe social.
Medo e vergonha
Coordenador da Cufa em Pelotas, Sandro Mesquita, relata que percebe um certo temor por parte das pessoas com menor poder aquisitivo quando o assunto é ir atrás dos direitos, muitas vezes por não possuírem informações básicas, e comenta sobre "o direito de ter direito". "As pessoas veem aquele prédio imponente [do Foro] e às vezes até ficam envergonhadas de entrar. As pessoas têm direitos, mas esquecem. Acredito que fazer essa conexão que torne acessível esse tipo de serviço faz com que as pessoas não precisem se locomover tanto", avalia. Além do resultado, em um primeiro momento, o coordenador afirma que esta pode tratar-se de uma ação simbólica e que o intuito é colher frutos. "Isso vai fazer com que, de repente, essas pessoas saiam daqui falando 'olha gente, não é tão difícil assim'''.
Os serviços se deram mediante agendamento prévio diretamente com a Cufa, com uma listagem fechada em 50 pessoas. Os atendimentos aconteceram das 9h às 12h e os assuntos mais acessados foram voltados ao Direito do Consumidor, acompanhamento de andamento processual, pensão alimentícia e reconhecimento de paternidade. "Entre os casos que mais recebemos, a maioria está vinculada à vara de família, principalmente a negligência paterna e a questão da pensão alimentícia, direito básico das crianças e que é um dever básico e muitos pais negligenciam", explica a estudante de Direito e estagiária do Foro, Letícia Carvalho.
A busca por informações também é apontada pela acadêmica Ana Giudice. "Observamos como a justiça ainda é algo distante das pessoas, porque a gente recebe perguntas tão simples, mas elas realmente não possuem acesso a algo que acaba sendo essencial", observa. "O sistema Judiciário reconhece que o Foro é um local pouco amigável, somente pelo prédio já gera um temor nas pessoas, por pensar que será julgado quanto a sua vestimenta, seu modo de falar ou seus questionamentos".
Roda de conversa
Também na manhã de ontem, a parceria entre Foro e Cufa elaborou um "círculo de paz", com enfoque no trabalho de justiça restaurativa. "Este é um método que busca que as pessoas dialoguem e reflitam sobre várias questões e, principalmente, resolvam conflitos", explica o juiz de Direito. A conversa contou com a presença de dez líderes de comunidades próximas, além de representantes do Judiciário. O foco foi voltado a uma reflexão do papel da liderança nas favelas e sobre meios da justiça alcançar as pessoas com menor poder aquisitivo.
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