Luta

Ainda à espera do Centro de Convivência

Aguardado há dois anos, o espaço destinado a jovens e adultos com autismo segue sem previsão para sair do papel em Pelotas

Carlos Queiroz -

Pessoas diagnosticadas com o Transtorno do Espectro Autista (TEA) e seus familiares seguem aguardando a implantação do Centro de Convivência, Autonomia e Aprendizagem. A iniciativa, que é destinada a jovens e adultos autistas, já recebeu quase meio milhão de reais para sair do papel, mas ainda não é uma realidade em Pelotas. De acordo com o Poder Público, apesar desta contribuição financeira, o valor não cobre todos custos do serviço.

A presidente da Associação de Amigos, Mães e Pais de Autistas e Relacionados com Enfoque Holístico (Amparho), Eliane Bitencourt, lembra que, em 2020, o município recebeu R$ 450 mil em emenda parlamentar da deputada federal Liziane Bayer (Republicanos) para a implantação do Centro. No entanto, o valor deveria ser usado na aquisição de equipamentos e na manutenção do serviço e, como contrapartida, o Poder Executivo deveria ofertar o prédio. Porém, até agora o projeto não foi posto em prática. “Só dizem que estão viabilizando, nada de concreto. Queremos saber onde está nosso dinheiro. Já estamos em 2022 e nada”, comenta Eliane.

A gestora da Amparho conta que muitos autistas não conseguem completar o Ensino Fundamental e aqueles que finalizam muitas vezes não ingressam no Ensino Médio, ficando sem nenhuma atividade. “Precisamos ter um espaço que oportunize autonomia e aprendizagem para esses jovens e adultos. Onde possam conviver com seus pares e ter um atendimento adequado para a sua faixa etária. Um local que proporcione lazer, preparação para a vida e para o trabalho”, explica.

Aprendizado em desacordo com a idade
Uma das mães que luta por esse espaço é Roberta dos Santos, 38, que busca a oportunidade de seu filho Eliseu, de 17, poder conviver com outros jovens da mesma faixa etária. “É um essencial gigantesco na vida deles, pois um aprende com o outro, aprende com o convívio. Hoje, quanto mais eles vão crescendo, mais diminuem os atendimentos e os espaços de convívio”, comenta.

Atualmente, além de ser atendido por duas instituições, Eliseu frequenta a escola regular três vezes por semana. Porém, Roberta conta que o foco maior é na alfabetização e, para ela, o jovem deveria ser incentivado a realizar outras atividades que lhe possibilitariam uma maior autonomia. “O serviço não é adequado para a idade. Ao longo dos anos vão chegando coisas novas e ele está preso no que fazia quando ainda era pequeno”, finaliza.

Um espaço necessário
Para o jornalista Fábio Cóssio, 35, o serviço é de extrema importância, devido à necessidade de um ambiente que acolha e inclua os autistas, principalmente os adultos. Ele conta que apesar da evolução, ainda há limitações no mercado de trabalho e para a continuação dos estudos. “Precisamos que o ensino seja de acordo com a faixa etária, mas com adaptações, pois não se pode dar tratamento igual para alunos autistas e não autistas”, explica.

Cóssio recebeu o diagnóstico de TEA há dois anos. O jornalista lembra, no entanto, que desde pequeno já recebia um atendimento especial de familiares e na escola. “O diagnóstico tardio se deu muito mais porque a gente entendeu que ele não precisava saber. Primeiro porque durante muito tempo não tinha quem diagnosticasse e o receio que a gente tinha era que no momento em que dele soubesse do autismo acabasse pensando que não poderia fazer alguma coisa por ser autista. Quando ele estava, no meu ponto de vista, maduro, nós procuramos quem pudesse fazer o diagnóstico. A partir daí, ele passou a se entender melhor”, conta a mãe de Fábio, Maria de Fátima Cóssio, 63.

Formado há 13 anos em Jornalismo, ele aborda - entre outros assuntos - o autismo em sua página no Facebook, chamada de Outras Vozes. O projeto criado por ele e pelo irmão já conta com mais de nove mil seguidores.

Relembre
Em 2019, o projeto de criação do Centro de Convivência foi inscrito pela Amparho no programa Você Decide, da deputada Liziane, uma iniciativa que - através de votação popular - escolheria uma atividade para receber recursos federais. Com a maioria dos votos, o plano foi o escolhido para receber R$ 950 mil em emenda parlamentar, montante destinado para a implantação do serviço. Em outubro do ano seguinte, uma parte do valor foi entregue ao Poder Executivo e os R$ 500 mil que faltavam seriam encaminhados após o início das atividades.

o que diz a prefeitura
De acordo com a Secretaria Municipal de Saúde (SMS), a emenda encaminhada pela deputada foi direcionada ao custeio da rede de Atenção Básica e, com isso, só poderia ser usada para a ampliação de serviços existentes. No entanto, com as necessidades da pandemia e a paralisação de muitos projetos, o recurso foi utilizado para a compra de equipamentos de proteção individual e álcool para higienização e ainda para o pagamento dos profissionais de saúde.

A pasta ainda informou que não há previsão para implantação do serviço, pois depende de recursos e o envio da emenda não resolve a parte financeira, tendo em vista a necessidade de custeio permanente. Para tornar viável a criação do Centro, o município chegou a tratar de uma parceria com o governo do Estado, buscando um local onde o projeto pudesse ser estabelecido.

Com a chegada da pandemia, a iniciativa precisou ser paralisada, mas a prefeitura pretende retomá-la em breve, para que possa sair do papel. O Executivo ainda destacou que irá buscar novamente a parceria com o governo gaúcho, vista como de extrema importância para viabilizar o Centro de Convivência.

Por mais autistas em todos os espaços
Inspirado pela iniciativa de um norte-americano, o fotógrafo Elison Bitencourt resolveu registrar momentos de seu irmão Márcio, 17, que é autista. A partir daí, surgiu a ideia de estender o projeto a outros jovens e adultos da Amparho. Como resultado, as fotos viraram uma exposição, que chega à sua segunda edição - a primeira foi em 2019. “A ideia é mostrar que lugar de autista é em todo lugar. Onde eles quiserem ir, é o lugar deles, como em um estúdio de fotografia. Eles são pessoas como a gente, com seus defeitos,

Singularidades, habilidades, qualidades e podem estar em qualquer lugar”, afirma. A exposição Em Tons de Azul II está disponível para visitação na praça de alimentação do Shopping Pelotas até o próximo sábado (30). em funcionamento, também no shopping, a Loja do Bem, onde estão sendo comercializados itens de apoio ao autismo como camisetas, chaveiros entre outros. O espaço funciona de segunda a sábado, das 10h às 22h.

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