Saúde

Diagnóstico de TDAH muda a vida de adultos

Transtorno mais comum em crianças pode trazer profundos impactos na idade adulta

Foto: Divulgação - DP - TDAH tem origem na infância, a partir do desenvolvimento neurológico

Se no passado o senso comum acreditava que o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, o TDAH, era um transtorno do neurodesenvolvimento exclusivo de crianças, hoje é consenso científico de que afeta também adultos. A quebra de tabus e o acesso facilitado à informação fez com que o número de pessoas diagnosticadas com o transtorno na idade adulta crescesse. Embora não haja dados precisos, entidades como a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA) estimam que de 6% a 8% das crianças tenham TDAH e um estudo publicado em 2020 projeta o transtorno em 2,58% dos adultos no mundo.

Nesse meio tempo, até que haja diagnóstico e acompanhamento profissional, seja por psicólogo ou psiquiatra, o paciente vai acumulando prejuízos, com impactos na vida escolar e acadêmica, na profissão e nas relações familiares e afetivas. Além disso, a falta de tratamento e as dificuldades causadas pelo TDAH podem ser acompanhadas do desenvolvimento de outros transtornos, como depressão, ansiedade e bipolaridade.

Se na infância o TDAH se manifesta mais claramente na hiperatividade e nas dificuldades na escola, adultos com a condição vivem constante luta interna para focar em tarefas, seguir instruções e organizarem sua rotina. Mesmo que os sintomas tendam a diminuir a partir da adolescência, a impulsividade e a ansiedade podem se tornar empecilho para adultos.

Para a neuropsicóloga Manoela Ávila, a procura de adultos por tratamento parte de rompimento de preconceitos quanto ao auxílio psicológico. "Até hoje ainda tem muita gente com preconceito. De um tempo pra cá, com o acúmulo de funções, de tarefas, os adultos estão percebendo disfuncionalidade no próprio comportamento, e é quando vêm para a terapia", diz.

A especialista explica que o diagnóstico também é um processo de aceitação. "Quando tu te identifica com um grupo e entende que aquilo não é uma característica ou defeito, mas sim uma situação maior, aquilo te alivia, porque dá um nome."

Origem na infância e tratamento eficaz
O psiquiatra Augusto Bittencourt, professor do curso de Medicina da UCPel e mestre em neurociências, explica que o TDAH tem origem na infância, no desenvolvimento neurológico, afetando o córtex pré-frontal, causando déficit de dopamina, neurotransmissor que atua no controle da impulsividade e na sensação de recompensa. "O cérebro de quem tem TDAH é como se fosse uma rádio fora de sintonia, em que não se consegue ouvir estação específica. O paciente tem um turbilhão de pensamentos e não consegue focar no que é mais importante", explica.

O médico avalia que o tratamento pode mudar a vida do paciente. "Pessoas adultas que têm TDAH e não fazem tratamento têm maior risco de dependência química ao longo da vida, têm mais acidentes de trânsito, podem ter conflitos conjugais e têm prejuízos no estudo e no trabalho", exemplifica. Segundo ele, o tratamento medicamentoso é um dos mais eficazes da medicina, com efeitos imediatos.

Diagnóstico libertador
A professora e estudante de artes Ingrid Islabão, 28, recebeu o diagnóstico há menos de dois meses. E diz ter sido um alívio. "Estou há muito tempo sem saber o que acontece na minha cabeça", diz, compartilhando que a luta contra a depressão desde a adolescência aumentou ainda mais a confusão. Para Ingrid, a suspeita de TDAH veio após se identificar com publicações nas redes sociais que listavam características do transtorno.

Agora, podendo dar nome para o que sentia, a professora pode olhar para trás e entender sua trajetória. "Ninguém conseguia olhar para mim e entender que o problema não era só rebeldia, falta de atenção, não era má-vontade. Hoje é uma coisa que me dói um pouco, pensar que cresci sem perceberem muitas coisas e que eu podia ter tido vida mais tranquila em algumas partes, ter conseguido manter constância, que é uma super difícil para a gente."

Sob tratamento com a menor dose diária de medicamento estimulante, Ingrid já sentiu melhora nos sintomas e aumento de foco, produtividade e qualidade de vida. "Agora, a minha perspectiva é que eu tenho potencial, tempo e energia pra fazer as coisas, fazer planos mais longos que uma semana", compartilha.

Conscientização e identificação
Thata Finotto é criadora do Tribo TDAH, maior podcast sobre o transtorno em língua portuguesa do mundo. Ela foi diagnosticada ainda na infância, mas só descobriu depois de adulta, enfrentando quadro depressivo. A iniciativa de iniciar o podcast foi criar referência em português para conscientizar sobre o assunto. "Existe um poder em saber quem você é, saber as coisas que você tem e entender os seus limites", diz.

Hoje Thata ocupa papel de liderança em busca da conscientização e do reconhecimento sobre o TDAH. No Brasil, uma lei de 2021 prevê o acompanhamento integral para alunos com o transtorno na educação básica. Atualmente, tramita outro projeto de lei que prevê atendimento especializado também no Ensino Superior. "O que a gente precisa agora é reconhecer TDAH como uma deficiência, assim como outros países já reconhecem", diz, citando Estados Unidos e países europeus. "Antes que as pessoas falem que cotas ou acessibilidade é vantagem, não existe vantagem quando você já tem muitas dificuldades te puxando para trás em diversos aspectos da vida", defende.

Sintomas de TDAH em adultos

- Desatenção, como dificuldades para ler ou acompanhar um filme
- Esquecimento, como perder chaves ou objetos com frequência
- Dificuldade em cumprir horários, com atrasos para compromissos
- Inquietude, como ficar constantemente mexendo em algo ou batendo os pés
- Falar em excesso e interromper outras pessoas
- Dificuldade para lidar com frustrações
- Impulsividade, como compras não planejadas e dirigir de forma perigosa
- Propensão a dependência de álcool, nicotina ou drogas

Tratamentos

- Acompanhamento psicológico e psiquiátrico
- Medicações, estimulantes ou não, com prescrição​

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Fenadoce inicia com bom público Anterior

Fenadoce inicia com bom público

STF homologa acordo sobre perdas de estados com ICMS de combustíveis Próximo

STF homologa acordo sobre perdas de estados com ICMS de combustíveis

Deixe seu comentário