Tristeza
Dor, emoção e pedidos por providências em protesto na Ildefonso
Moradores trancaram a avenida Ildefonso Simões Lopes, próximo ao Arco-Íris, para protestar contra acidentes na via, que já resultaram em 22 óbitos em 10 anos
Carlos Queiroz -
O clima de comoção tomou conta da avenida Ildefonso Simões Lopes no fim da tarde desta quarta-feira (13) quando, revoltados com a grande quantidade de acidentes de trânsito na via, moradores realizaram um protesto, partindo do loteamento Arco-Íris em direção ao centro e trancando o trânsito. Para reclamar da situação e cobrar providências do poder público, a população, trajando roupas pretas, parava em pontos onde lembravam-se de acidentes, faziam círculos e, munidos de cruzes e cartazes com palavras de protesto, rezavam pelas vítimas. A prefeitura, por sua vez, anunciou no início da semana que algumas mudanças em relação ao fluxo de veículos serão adotadas.
O estopim foi a morte de Jonathan Dias Ramos, 26, atropelado em acidente na semana passada em frente ao Instituto Federal sul-rio-grandense Campus Visconde da Graça (IF-Sul - CaVG). Além do óbito, duas pessoas ficaram feridas. Foi a primeira morte em 2019 na avenida, que registrou também quatro casos fatais no ano passado - um motociclista vitimado por colisão em fevereiro, um pedestre, após uma colisão, em junho, um passageiro que estava em uma capotagem, em agosto, e um pedestre atropelado em outubro.
A viúva de Jonathan, Paula Soares, acompanhou o protesto, levando no colo o pequeno filho do casal, Jonathan Miguel, que completará dois anos de idade na semana que vem. Ela conta que o marido estava feliz, voltando do primeiro dia de trabalho, um bico de pintor que fazia para tentar driblar o desemprego. Ele estava acompanhado pelo pai dela quando foram atingidos, ambos de bicicleta, por uma condutora. Ela ainda acertou um terceiro homem. O pai sofreu fratura na perna, mas recupera-se bem. "Que a morte dele não tenha sido em vão. Que as autoridades tomem alguma providência […] não é a primeira vida que é perdida aqui por imprudência", lamentou. No ponto em que ele faleceu, as marcas de sangue ainda são visíveis no asfalto, junto de pedaços do veículo que o atingiu e ainda seguem ali. Em volta das marcas, uma roda com cruzes brancas foi feita e a emoção tomou conta dos presentes, que rezaram por Jonathan.
Entre as rodas de oração no meio da rua e a caminhada, moradores das redondezas uniam-se ao protesto. A maioria de preto, vários com histórias tristes envolvendo a via, que alguns chamam de 'estradão', envolvendo acidentes ou algo próximo disso. Pessoas que passavam aplaudiam ou gritavam palavras de incentivo. Alguns motoristas também buzinavam em solidariedade, com o fluxo da via bloqueado para os dois lados. O motociclista Luiz Felipe Wassmansdorf, morador das redondezas, disse que passa por ali a pé, de moto ou de bicicleta, e o temor é grande. "A violência no trânsito aqui é muito presente pela falta de fiscalização", apontou.
Um dos principais motivos da reclamação, além da falta de sinalização ou de dispositivos de segurança para diminuir a velocidade, é a falta de um espaço para ciclistas ou pedestres passarem. Mesmo com as atitudes tomadas pela prefeitura (confira), outras mudanças eram cobradas. Jaqueline da Costa, também moradora do Arco-Íris, contou que, quando faz suas caminhadas, várias vezes teme cair no canal que costeia a via, tendo um espaço de poucos centímetros entre a pista e o grande buraco para locomover-se junto a outros pedestres e ciclistas. Ela também já foi vítima de acidente na via e sofreu lesões. "Eles [os motoristas] andam a mais de 100 km/h, fazem ultrapassagens indevidas, com charretes dividindo o espaço…", lamentou.
Duas dezenas de mortes e potenciais mudanças
Entre 2008 e outubro 2018 foram 21 óbitos registrados após acidentes de trânsito na avenida Ildefonso Simões Lopes, segundo dados da Secretaria Municipal de Transporte e Trânsito (SMTT). Isso representa 4,7% dos 442 óbitos ocorridos em Pelotas durante esse período, incluindo as rodovias.
Agora, a prefeitura bate de frente contra a imprudência na avenida. Na última terça-feira anunciou uma série de medidas para reduzir a velocidade dos condutores. Quatro lombadas serão instaladas, sendo duas próximas ao acesso ao Arco-Íris e as outras duas nas entradas dos loteamentos Moradas e Liberdade. Além disso, os agentes irão fiscalizar diariamente, com radar móvel, o trecho entre as avenidas Guadalajara e Leopoldo Brod.
Ao Diário Popular, o titular da SMTT, Flávio Al Alam, diz que o fluxo aumentou com o crescimento do número de loteamentos na região. Para resolver isso, a primeira lombada deverá começar a ser construída pela Secretaria Municipal de Obras e Pavimentação (Smop) ainda nesta quinta, se as condições climáticas favorecerem, deixando as outras três para a próxima semana. Outros dois passos para diminuir os acidentes também são projetados. O mais próximo é a construção de rotatórias nas entradas de residenciais. "Vamos tentar fazer ainda neste ano e com recursos próprios", promete.
O outro, no entanto, é mais complicado. A duplicação da via é sonho antigo, mas esbarra na falta de recursos. O projeto está sendo desenhado há mais de dois meses, segundo o secretário, mas não há previsão de conclusão, nem de execução. "Nós não temos, hoje, dinheiro para fazer a duplicação. Deveremos buscar verba federal", explica. Após o projeto concluído e orçado, programas do Governo Federal serão analisados para tentar encaixar a obra e, então, tirar o antigo sonho do papel. Ele concorda que a via é apertada para ciclistas e pedestres, mas diz que só a duplicação pode resolver o problema.
Ciclofaixa pode ser completa este ano
A ciclofaixa da Ildefonso encerra-se em frente ao bairro Liberdade, mais de um quilômetro antes da entrada do Arco-Íris. A ideia é lançar a licitação para ela seguir até o encontro com a avenida Leopoldo Brod ainda neste ano. O projeto passa por alterações, segundo Al Alam, para adaptar-se já à proposta de duplicação.
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