Preconceito

Estudante de Medicina da UFPel registra caso de homofobia

Vítima alega discriminação de colegas há anos, incluindo episódio recente dentro de uma UBS em que atua

Foto: Carlos Queiroz - DP - Estudante diz que agressões já ocorrem há anos

Um registro feito recentemente na Delegacia de Polícia de Pelotas chama atenção para mais um possível caso de homofobia. A vítima, uma estudante de Medicina da UFPel, relata que vem sofrendo discriminações veladas por parte de colegas por conta de sua sexualidade. O episódio mais recente, e um dos mais constrangedores, se deu no dia 7 de fevereiro, no ambiente de trabalho da jovem.

Estagiária em uma UBS, ao abrir sua mochila para guardar os equipamentos usados nas consultas, encontrou um pênis de silicone, de propriedade da universidade e utilizado para fins didáticos. Ao conversar com a reportagem e pedindo para não ser identificada por temer represálias, a estudante relatou embaraço com a cena ocorrida diante dos demais colegas e médicos orientadores. Segundo ela, o fato teve sua reação imediata diante do que considerou crime de homofobia.

"Estou na faculdade há cinco anos e nesse tempo sofri bastante discriminação e agressões veladas, o que é mais típico em se tratando do meio de Ensino Superior. Como as pessoas já são mais orientadas, elas sabem que certas coisas não devem ser verbalizadas, que certos atos não podem acontecer. Mas isso não significa que não expressem preconceitos de outras formas", diz. Na universidade desde os 17 anos - atualmente tem 22 -, a jovem diz sempre ter sido discreta por entender que sua orientação sexual não deveria ser assunto no ambiente profissional. Contudo, lembra de episódio em que, já no segundo ano de faculdade, uma colega gritou seu nome junto ao termo "sapatão".

Mudança de comportamento

A partir desse primeiro caso de homofobia, a estudante conta ter havido mudança brusca no comportamento dos colegas. "Foi gritante, tanto que até meus colegas da época do segundo grau e que entraram comigo na faculdade se afastaram, restando apenas dois, que são fiéis à nossa amizade."

Agora, no recente constrangimento sofrido na UBS em que estagia, diz ter sentido a mesma sensação de vulnerabilidade da festa. "Foi o que senti quando se deu a situação na UBS, assim como humilhação. Não por ser quem sou, mas por ser exposta dessa forma para tanta gente. É uma verdadeira invasão de privacidade", protesta.

A jovem conta que, mesmo quando não é vítima de homofobia explícita, é perceptível o preconceito. "Minhas colegas não querem ficar no mesmo ambiente que o meu. É como se eu fosse uma predadora." Os episódios tornaram-se tão frequentes que procurou professores para contar como se sentia. "Foram muito receptivas, mas afirmando que essa era uma realidade que eu ira enfrentar até o final do curso", lamenta. Diante da realidade, passou a fazer terapia para ajudar com a fobia de ter que enfrentar os colegas diariamente.

Revolta dos familiares

A mãe não esconde a indignação. "O que acontece dentro da tua casa não interessa a ninguém. No teu ambiente de trabalho, o que importa é o profissional que tu é. A falta de respeito para com as pessoas mostra a falta de educação que já vem de casa", reclama. Segundo ela, a família vai lutar para que haja responsabilização de quem tem agido de forma preconceituosa. "As pessoas têm que parar de achar que isso é brincadeira. Isso é uma violência, é assédio moral, é crime", conclui.

Abalada pelo caso da UBS, a aluna ficou afastada recentemente do ambiente da universidade durante dez dias, por orientação médica. "Quem está pagando até o momento sou eu, a vítima. Nenhum dos causadores da situação está pagando. Estão vivendo suas vidas, tranquilamente como se nada tivesse acontecido."

As pessoas envolvidas na situação da UBS serão representadas criminalmente pela vítima, que já acionou representante legal, tanto para ter acesso às câmeras de monitoramento dentro da unidade de saúde quanto para levar o caso adiante. Ela já entrou em contato inclusive com o Núcleo de Gênero da Faculdade, onde diz ter recebido todo respaldo.

O que diz a Coordenadoria

A coordenadora do Colegiado de Medicina da Famed, Silvia Elaine Cardozo Macedo, informou que o colegiado tomou conhecimento do fato na manhã do dia 8 de fevereiro, através de e-mail enviado pela aluna na noite do dia 7, relatando os acontecimentos. Frente ao relato, naquele mesmo dia, encaminhou-se despacho ao Núcleo de Gênero e Diversidade da UFPel (Nugen), órgão institucional responsável por tratar destas questões, solicitando orientações e providência.

O que diz o Nugen

O chefe do Nugen, o terapeuta ocupacional Rodrigo da Silva Vital, ressalta que a UFPel não tolera qualquer tipo de violência ou preconceito. No caso da estudante, informou que já foi feito o acolhimento, orientações legais e encaminhamentos. O Nugen também já fez contato com o setor de segurança da universidade, solicitando o acesso às imagens da UBS, permitindo que as pessoas responsáveis pelo ato sejam identificadas. O Núcleo afirma que, assim que colher todas as informações, irá montar processo de denúncia para a Ouvidoria da universidade, recomendando sindicância para a apuração de irregularidades de conduta, com possibilidade de encaminhamento para a Polícia Federal se houver suspeita de homofobia. O que, no Brasil, se enquadra como crime de racismo.

A coordenação do Nugen convocou reunião com a coordenação do curso, supervisão de estágio e os preceptores da UBS, ocorrida na última segunda-feira. O Núcleo deu prazo para que o responsável por colocar o objeto na mochila da vítima se manifeste. Caso isso não ocorra, a apuração interna irá determinar o autor para que o caso seja encaminhado às autoridades competentes.

A coordenação ofereceu à aluna a possibilidade de continuidade do estágio em outra UBS, caso seja este o seu desejo, enquanto a situação está sendo avaliada. "O Núcleo vai acompanhar a estudante em todo esse processo, garantindo a sua segurança institucional para que a mesma não sofra retaliação, perseguição, assédio ou discriminação por ter feito a denúncia", afirma Rodrigo.

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Atraso na compra de quimioterápicos no Ceron preocupa comunidade Anterior

Atraso na compra de quimioterápicos no Ceron preocupa comunidade

Pelotas registra 25 novos casos de Covid-19 Próximo

Pelotas registra 25 novos casos de Covid-19

Deixe seu comentário