Diferente
Namoro de papel passado
Contrato de namoro vem surgindo como forma de proteger os bens em um relacionamento
Gabriel Huth -
Um contrato inusitado vem chamando a atenção nos cartórios brasileiros. Procurado por quem deseja proteger os próprios bens, o contrato de namoro é a oficialização de uma relação sem muitos compromissos. Em Pelotas, dois tabelionatos afirmam ter o documento à disposição dos clientes, mas nenhuma relação do tipo foi formalizada.
Alex Fagundes, funcionário de um cartório da cidade, explica que o documento é uma declaração de ambas as partes dizendo que sua relação não configura uma união estável. As cláusulas do documento reconhecem que o casal mantém um relacionamento afetivo que se caracteriza como namoro e declaram que eles não pretendem constituir uma família, contrair matrimônio ou viver em união estável.
Mas, se no futuro a intenção for evoluir para um relacionamento mais formal, o documento permite o avanço. O casal pode, inclusive, incluir no contrato de namoro essa opção e declarar já naquele momento qual o regime de bens que deverá vigorar - geralmente o de separação. O acordo pode ser feito em um tabelionato e deve ser assinado também por duas testemunhas. Fagundes informa que o valor desse tipo de documento é R$ 77,60.
O advogado e professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) Gustavo Gazalle alerta que em algumas situações judiciais o contrato não tem validade. Muito mais que colocar suas intenções no papel, é necessário que o casal viva de fato aquilo que está documentado. "Se o juiz entender que aquele casal tinha uma comunhão de vida, vivia em união estável, o documento não ajuda", comenta Gazalle. Este tipo de acordo, conforme o advogado, é mais comum entre pessoas de maior poder aquisitivo. "É uma forma de se proteger naquela relação", fala.
Sociedade do medo
A desconfiança está cada vez mais presente na sociedade e se estende para as relações afetivas. A psicóloga Marlise Real considera que esse comportamento é ensinado desde o início da vida, especialmente às novas gerações. "As crianças de hoje são instruídas a não confiar em ninguém", frisa. A proteção conferida pelos pais a seus filhos é outro fator que reflete em pessoas mais temerosas. "Os pais preferem seus filhos adultos em casa do que casados", fala.
Desentendimentos no relacionamento e a raiva que eventualmente surge com o término levam à vontade de explorar financeiramente o outro. "A não aceitação de que as relações podem terminar, que algumas não são para sempre, leva a isso", explica Marlise. É nesse contexto que surge a vontade de se proteger do próprio companheiro antes mesmo de se pensar no fim do namoro. "Cada um quer se preservar para não sair lesado", comenta.
Um histórico negativo de divórcios na família também pode influenciar na hora de optar pelo contrato de namoro. "Historicamente, as separações foram marcadas por situações em que um tenta tirar o máximo de dinheiro do outro", considera a psicóloga. Soma-se a isso a falta de diálogo no relacionamento e a desconfiança dá sinais claros de que está presente. "O afeto fica em segundo plano e o econômico prevalece", pontua Marlise.
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