A cápsula do tempo encontra-se vazia. Em ação inicial do Laboratório Aberto de Conservação e Restauro de Bens Culturais da UFPel, o conteúdo acomodado na caixa que residiu por 88 anos na base do monumento em homenagem a Yolanda Pereira foi transposto para bandejas e mergulhado em água deionizada, ou seja, sem a presença de sais minerais. Em primeira análise, a equipe de profissionais já identificou algumas surpresas.

O maior volume refere-se a fragmentos de jornais, incluindo algumas cópias em bom estado da publicação O Caixeiral. Há expectativa de encontrar exemplares do Diário Popular, uma vez que estas duas instituições participaram da homenagem à Miss Universo na praça Coronel Pedro Osório. "Pode aparentar frágil, mas o papel resiste bastante", salienta a coordenadora do projeto, Andréa Bachettini.

Além dos periódicos, um exemplar do Almanaque de Pelotas, datado de 1931, apresentava-se praticamente inteiro dentro da caixa. O conservador e restaurador do Museu da Baronesa, Marcelo Madail, também envolvido no processo, conta que a encadernação original terá a brochura desfeita para que cada página seja recuperada individualmente. "O próprio material diz como devemos nos comportar", explica.

Junto aos itens, foi possível reconhecer um retrato da pelotense impresso em tecido e, possivelmente, uma fotografia da Miss, realizada pelo Studium Inghes, com autógrafos; porém, esta revelou-se bastante comprometida. O principal destaque entre os achados manifesta-se nos clichês de moedas de prata. Por décadas, a falta de comprovação tornou um mistério a real existência das moedas cunhadas com a efígie da homenageada, representando a Segunda República. A cápsula do tempo possibilitou a confirmação física destes objetos.

Sobreviventes ao tempo
Durante a manhã desta quarta-feira (22), o secretario de Cultura, Giorgio Ronna, e o pesquisador Guilherme de Almeida, responsável pelo dossiê histórico sobre a urna, acompanharam o trabalho de conservadores e restauradores. Almeida considerou um saldo bastante positivo, tendo em vista o estado alarmante do conteúdo, observado logo após a abertura oficial na semana passada. A caixa estava com muita água acumulada em seu interior, numa mistura de pedaços de jornais com a ferrugem pertencente ao recipiente.

Durante a tarde, o laboratório recebeu a visita do especialista em metais, Marcus Granato, da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). Na sequência, será realizada uma reunião via Skype com a porto-alegrense Virgínia Costa, especialista em restauro de obras com metal. Ambos profissionais devem contribuir para a recuperação do cofre, a fim de identificar a liga metálica da qual é constituído e evitar a corrosão.

Próximas fases
A professora e coordenadora do laboratório acredita que será possível recuperar boa parte dos documentos e, inclusive, a caixa que guardou a memória de Yolanda Pereira. Cada página terá seu tratamento individual, incluindo passagem por uma secadora de papel e depois prensagem para planificação. A segunda etapa compreende montagem e colagem dos fragmentos. "Será como um quebra-cabeças", define. O processo completo possui previsão de três meses de duração.

O material, como um todo, será musealizado e, depois, apresentado em exposição promovida pela Universidade. Andréa adianta a intenção de produzir um e-book que reúna a pesquisa sobre a pelotense, a descoberta da cápsula e o processo de conservação e restauro das peças. "Não se pode ter pressa. Tudo é feito com muito cuidado", acredita Andréa.