Cotidiano
Os perigos de se manter muito tempo sentado
Pelotenses estão acima da média nacional, com 4 horas por dia na posição
Cerca de 433 mil mortes poderiam ser evitadas, por ano, no mundo - o equivalente a 3,8% do total - se a população não passasse mais de três horas, por dia, sentada. É o que aponta estudo desenvolvido pelo Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) em parceria com a Universidade de São Paulo (USP). O desafio à comunidade científica, daqui para frente, é verificar o quanto a prática de exercícios físicos poderia reduzir o risco de mortalidade associado ao excesso de tempo sentado. É uma lacuna ainda não respondida.
Em aproximadamente 15 anos de pesquisas realizadas ao redor do globo, as consequências de permanecer muitas horas sentado aparecem mesmo entre quem adota a recomendação de vida saudável e faz atividades físicas. "Buscamos fugir dessa lógica punitiva, de uma abordagem pesada, que acaba enxergando a cadeira como um dos males do século 21 e culpando as pessoas que ficam muitas horas sentadas", destaca o doutorando em Epidemiologia, Gregore Mielke, um dos autores do alerta.
Para realizar o levantamento, o sexteto se dedicou à compilação de dados de 54 países e se debruçou também sobre informações da Organização Mundial de Saúde (OMS), sobre estudos de prevalência e sobre pesquisas feitas, principalmente, na Austrália, no Canadá e nos Estados Unidos; referências internacionais no tema. E chegaram a mais uma conclusão que faz soar o sinal vermelho: 296 mil mortes - 2,6% do total - poderiam ser evitadas, por ano, se as pessoas ficassem duas horas a menos, por dia, sentadas. O convite, portanto, é para colocar o corpo para funcionar, com atos simples: basta levantar e circular um pouco - leia mais detalhes na arte.
Entenda melhor
- Consequências do excesso de tempo sentado
- Fisiológica: ao permanecer sentada, a pessoa tem baixa movimentação muscular. Com os grupos de grandes músculos (do tronco e do quadríceps) sem atividade por um período de aproximadamente três horas, o organismo para de produzir a enzima que auxilia na produção do HDL (colesterol bom) e na captação de triglicerídeos da corrente sanguínea. A longo prazo, portanto, com o comportamento sedentário adotado de forma crônica, os baixos níveis de HDL e as altas taxas de colesterol e de glicose podem levar a doenças cardíacas ou ao diabetes, por exemplo. É importante saber, entretanto, que a enzima volta a ser produzida tão logo retornam as contrações musculares. Para isso, é preciso que você se movimente.
- Gasto energético: na prática, trocar a posição sentado para em pé faz toda a diferença. Se ao invés de ficar duas horas sentado, você permanecesse duas horas em pé, em termos de gasto energético, a troca equivaleria a uma caminhada de 30 minutos - explica o doutorando.
- Veja as principais intervenções para mudar essa realidade
1 - Incentivo a outras formas de deslocamento: se a sua atividade profissional faz com que você se mantenha longos períodos sentado, uma boa alternativa pode ser deslocar-se ao trabalho de bicicleta ou a pé. É uma decisão que uniria melhora nos indicadores de saúde, redução dos níveis de poluição e um trânsito menos congestionado. Para isso, é preciso envolvimento do Poder Público e da iniciativa privada. Os governos devem investir cada vez mais em infraestrutura, com a criação de ciclovias seguras. As empresas, por outro lado, também devem oferecer condições para os funcionários deixarem o carro de lado. Isso significa oferecer local apropriado para as bicicletas serem guardadas e ainda vestiários para os trabalhadores tomarem banho antes de começar o expediente, se desejarem.
2 - Levante e circule: uma das principais orientações é quebrar a rotina de permanência sentado. Na medida do possível, em uma média de duas em duas horas, levante e circule. Não é necessário realizar alongamentos, por exemplo. Só o fato de caminhar um pouco já irá forçar as contrações musculares e os seus benefícios. "É importante, incorporar o hábito do movimento ao longo do dia." As empresas também podem contribuir neste processo e disponibilizar mesas ajustáveis aos funcionários, que os permitam, em determinados momentos, mudar de posição e trabalhar em pé.
Em casa, a mesma recomendação deve ser adotada. E, de novo, aparece o papel do Poder Público em oferecer e qualificar as áreas de lazer, que sirvam de convite para não permanecer estático em frente à TV e ao computador por longas horas - defende o pesquisador. "Nem sempre aquilo que fazemos é propriamente uma escolha", argumenta. Não raro, é a opção que resta ao cidadão.
As médias de tempo sentado (*)
- No mundo: 4,7 horas por dia
- No Brasil: cerca de três horas por dia
- Em Pelotas: 4 horas por dia
(*) Em geral, homens, pessoas com maior escolaridade e renda (em função dos deslocamentos motorizados) e idosos permanecem mais tempo sentados
Ainda é preciso saber mais
- A Ciência ainda precisará responder o quanto a prática de exercícios físicos regulares poderia reduzir os prejuízos de ficar sentado por períodos prolongados. É preciso verificar o quão independentes são estes dois comportamentos - explica Gregore Mielke e traça analogia com a alimentação. É como quando comemos uma boa porção de verduras e legumes; embora seja bom à saúde, o benefício não elimina os malefícios do alto teor de gordura de alguns alimentos também ingeridos. Ainda assim, defende com veemência a importância das atividades físicas.
- O padrão de tempo sentado - continuamente, sem levantar - pode ser mais prejudicial à saúde do que propriamente a quantidade total de horas em que você permanece sentado ao longo do dia, mas de forma intercalada. São os indicativos até o momento, mas o ponto ainda depende de aprofundamento - enfatiza o educador físico pelotense, que já projeta o pós-doutorado neste mesmo tópico de interesse.
Fique atento aos alertas
* Do Centro de Pesquisas Epidemiológicas da UFPel em parceria com a USP
- Cerca de 433 mil mortes poderiam ser evitadas, por ano, no mundo - o equivalente a 3,8% do total - se a população não passasse mais de três horas, por dia, sentada.
- 296 mil mortes - 2,6% do total - poderiam ser evitadas, por ano, se as pessoas ficassem duas horas a menos, por dia, sentadas.
- O estudo, concluído no final de 2015, foi desenvolvido por cerca de dois anos.
- Participaram seis pesquisadores: Gregore Mielke (da UFPel) e Leandro Rezende, Thiago Sá, Juliana Visconde, Leandro Garcia e Juan Rey López (da USP).
* Da Universidade de Sydney
- A partir de três horas sentado, a cada hora a mais, aumenta em 2% o risco de mortalidade
- A partir de sete horas sentado, a cada hora a mais, aumenta em 5% o risco de mortalidade
- Autora: Josephine Chau (2013)
Uma vida inteira sentado, obrigatoriamente
Há cinco anos, Mário Chollet, 66, retomou a rotina como taxista. Resultado da aposentadoria. A vida profissional inteira, entretanto, foi sempre da mesma forma: como motorista. Sempre sentado horas atrás do volante. E sempre, também, longe de atividades físicas. "Deveria fazer, mas não faço."
Atualmente, depois de permanecer das 7h às 15h à disposição dos clientes, o pelotense vai para casa e, a partir de umas 19h, volta à mesma posição: sentado. Acomoda-se para assistir aos noticiários e, na sequência, migra - de preferência - às partidas de futebol. Aí, já é hora de descansar e se preparar para mais um dia. Sentado. Horas. Ao volante.
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