Estudo
Pesquisa mostra que estudantes negros foram mais impactados com a pandemia
Essa avaliação se refere a acesso a atividades remotas, conectividade, medo de desistir dos estudos e reabertura de escolas
Para entender as desigualdades de raça ou cor no acesso à educação durante a pandemia, Itaú Social, Fundação Lemann e BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) encomendaram à Plano CDE uma análise a partir dos dados das edições da pesquisa "Educação não presencial na perspectiva dos estudantes e suas famílias", realizada pelo Datafolha entre maio de 2020 a setembro de 2021 com pais e responsáveis por crianças e adolescentes da rede pública. Os números mostram que, nos dois recortes de renda analisados (até dois salários-mínimos e mais de dois salários-mínimos), os estudantes negros foram os mais impactados negativamente. Essa avaliação se refere a acesso a atividades remotas, conectividade, medo de desistir dos estudos e reabertura de escolas.
Acesso a atividades remotas
Logo no início do período em que as escolas ficaram fechadas, o acesso a atividades remotas se mostrou desigual: em maio de 2020, 79% dos estudantes brancos já tinham esse tipo de conteúdo, contra 70% dos alunos negros. A proporção é ainda pior quando consideramos a classe social: 84% para estudantes brancos com renda de mais de dois salários-mínimos e apenas 68% para os negros em famílias que recebem até dois salários-mínimos.
Com os esforços das redes em expandir, por diferentes meios, o acesso ao ensino remoto, a pesquisa mostra que a desigualdade, tanto de raça/cor quanto de renda, foi diminuindo. Em setembro de 2021, praticamente 100% dos perfis analisados afirmavam ter acesso ao conteúdo, digital ou impresso.
Conectividade
Os dados positivos na diminuição das diferenças em relação ao acesso de atividades remotas não contam toda a história de desigualdade educacional na pandemia. Isso porque as condições de aproveitamento desse conteúdo ainda persistem desiguais. Em relação à conectividade, dados de setembro de 2021 mostram que um estudante negro de renda familiar abaixo de dois salários-mínimos tem quatro vezes menos chance de ter em sua casa um computador com internet em comparação com um branco de renda familiar maior que dois salários-mínimos - 21% contra 86%, respectivamente. Ao contrário dos dados anteriores, a desigualdade de conectividade não diminuiu ao longo do tempo.
"Uma de nossas maiores preocupações está nesse gargalo de conectividade entre estudantes de diferentes raças e classes sociais. A dificuldade em acessar os conteúdos remotos gera desmotivação e essa falta de engajamento pode agravar o risco de desistência dos estudos, principalmente quando falamos de crianças e adolescentes negros com menor renda familiar", afirma Cristieni Castilhos, gerente de Conectividade da Fundação Lemann.
Medo de desistir da escola
O receio dos pais com a evasão escolar cresceu em todas as dinâmicas familiares analisadas. No entanto, os estudantes negros com renda de até dois salários-mínimos seguem em desvantagem: metade (50%) deles está em risco de desistir dos estudos. Esse número é de 31% entre os brancos com renda de mais de dois salários-mínimos. Neste caso, o gênero também influencia: 47% de pais ou responsáveis por meninos negros de famílias mais pobres têm medo dessa desistência, contra 36% para as meninas brancas com renda maior.
"Estudantes negros de famílias de menor renda enfrentam um cenário de crescentes dificuldades e desemprego em alta. Como muitos são responsáveis por suprir a renda familiar, não veem na educação uma perspectiva de melhoria da qualidade de vida. Assim, diminui muito seu interesse pela continuidade dos estudos. Para trazer mais equidade, é importante alocar mais e melhores recursos em escolas das regiões periféricas e realizar ações de recomposição da aprendizagem e correção de defasagem idade/série, combinadas a metodologias ativas. Estratégias para evitar esse abandono escolar podem ser realizadas em parceria com as organizações da sociedade civil, que contam com longa experiência nos territórios e já contribuem com o desenvolvimento integral das crianças e adolescentes", explica Angela Dannemann, superintendente do Itaú Social.
Reabertura de escolas
A reabertura das escolas pode trazer algum tipo de conforto para pais e responsáveis com a possível desistência dos estudos por parte de suas crianças e adolescentes. O processo de reabertura tem se acelerado para estudantes de ambas as raças/cores, mas ainda revela uma desigualdade entre estes grupos. Em setembro de 2021, 74% dos estudantes brancos contavam com suas escolas abertas, contra 63% dos negros. Os números são ainda mais díspares quando consideramos a classe social: 53% para alunos negros com renda abaixo de dois salários-mínimos e 83% para os brancos com famílias recebendo mais de dois salários-mínimos - isso revela que este último grupo tinha 57% a mais de chance de ter sua escola reaberta na época.
"A reprodução de padrões de desigualdade da sociedade brasileira no processo de reabertura das escolas preocupa pelos potenciais prejuízos para o futuro desta geração. Os estudantes negros, que já sofreram com o menor acesso a conectividade enquanto estavam com aulas remotas, têm hoje menos garantia de retorno às escolas, o que pode afetar negativamente o seu aprendizado e a própria permanência na escola. Acreditamos em uma educação pública de qualidade para todas e todos e, para isso, precisamos de políticas públicas que utilizem dados e informações de forma a garantir qualidade com equidade", afirma Daniel de Bonis, Diretor de Políticas Educacionais da Fundação Lemann.
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