O sonho de Lucas Dias, 17 anos, é cursar Engenharia da Computação. O de Jaqueline Rocha, 35, é de entrar na faculdade de Jornalismo ou Música. Até há cerca de 20 dias, os dois assistiam a aulas no pré-universitário Desafio, que oferta curso gratuito para pessoas de baixa renda. A dupla fez as provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em comum, além do sonho do Ensino Superior, está a impossibilidade de pagar um cursinho preparatório privado para a prova que permite o acesso a qualquer curso de graduação da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). O projeto é coordenado e foi criado por estudantes da universidade. 

São mais de dois mil alunos já aprovados na UFPel. As aulas, nos períodos da tarde e da noite, foram oferecidas para mais de 200 estudantes em 2018. Para comemorar o aniversário, foi organizado o seminário Desafio pré-universitário: 25 anos de resistência, reflexões e de educação popular. Entre esta sexta-feira (23) e o sábado (24), serão debatidos temas como a conjuntura nacional, com mesas-redondas em parceria com o curso pré-Enem da Furg, e ocorrerão apresentações culturais e conferências. A programação será no auditório da Faculdade de Direito. Na sexta, o evento começa às 8h30min e vai até às 21h. No sábado, as atividades são no turno da tarde.

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Com o viés da educação popular e gratuita, interessados inscrevem-se para se preparar para o Enem e assistem às aulas ministradas por estudantes de cursos de licenciatura da UFPel. “Destinado a incluir quem o sistema exclui”, diz a página nas redes sociais. Hoje são mais de 90 professores, divididos em nove áreas de conhecimento do exame nacional, além de Filosofia e Sociologia. As aulas, avalia Lucas, são diferentes da escola onde estuda, no bairro Fragata. 

“Muda bastante porque a gente se vê como amigos. As aulas são descontraídas. A gente percebe que eles estão aqui porque querem”, fala, referindo-se ao trabalho, realizado de forma voluntária. Apenas sete integrantes, que coordenam áreas e o próprio curso, possuem bolsas de extensão. Dias ficou sabendo da possibilidade através de uma prima. Cursando o terceiro ano do Ensino Médio, ele começou no início do ano a frequentar as aulas do Desafio para chegar preparado ao Enem. Apesar de considerar a prova difícil, acredita que teve um bom desempenho e que pode estar entre os selecionados da UFPel.

Experiência aliada à oportunidade
Ao mesmo tempo em que dezenas de estudantes dedicados a serem professores sentem falta de experiências práticas, pessoas com intenção de ingressar na universidade encontram dificuldade para se preparar para o Enem. A primeira experiência de Frederico Blank como professor numa sala de aula foi no Desafio. Estudante de Matemática, já ministra aulas no local há dois anos. “Entrei numa sala de aula e tinha 60 alunos, e aos poucos a gente foi criando vínculos, afeto, tudo o que melhora o processo de aprendizado. São princípios freireanos (relacionados a Paulo Freire)”, lembra Blank. Hoje, encontra no Restaurante Universitário (RU) ex-alunos, agora colegas de universidade. O mais importante, considera, é desenvolver a autoestima dos alunos para terem a convicção de merecer estar numa universidade, num curso superior, algo que costuma trabalhar durante as aulas. 

A coordenadora do projeto, professora Noris Leal, lembra inclusive de alunos antigos do Desafio que hoje são professores universitários. “Em 1993, quando surgiu o Desafio, era um momento que a gente lutava para manter a universidade 100% pública e gratuita, por ter alunos da periferia”, recorda. O momento, hoje, é parecido. Após grande expansão e democratização do acesso, o ensino público superior novamente enfrenta a falta e o contingenciamento de recursos, o que deve limitar o acesso e os investimentos na universidade.