Fortalecimento
Programa de compra de alimentos muda a vida de quilombolas
A aquisição de produtos locais garante qualidade e diversidade à mesa e renda aos produtores
O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) foi criado para assegurar o direito humano à alimentação adequada. É voltado às pessoas atendidas pelos serviços da Secretaria de Assistência Social (SAS). O projeto envolve prefeitura e agricultores e tem a assessoria técnica da Emater/RS-Ascar.
Os alimentos são utilizados nas refeições oferecidas aos usuários dos Serviços de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, Cras, abrigos de crianças e adolescentes, idosos, Casa de Passagem, e nas cestas oferecidas a famílias em situação de vulnerabilidade.
Os R$ 400 mil para utilizar em 2019, que antes saíam do orçamento municipal, passaram a ser custeado pelo governo federal. A principal diferença, no entanto, está nos fornecedores dos alimentos. Instituído em 2003, o PAA tem o objetivo de garantir a segurança alimentar de quem consome e renda a quem produz. Todas as frutas, verduras, hortaliças e grãos saem diretamente das propriedades rurais da região, vendidas pelos agricultores, sem a participação de intermediários.
De acordo com o secretário da SAS, Luiz Eduardo Longaray, em 2018 a Assistência Social investiu R$ 180 mil em hortifrutigranjeiros. Com o PAA, além de aumentar o volume de alimentos, os recursos municipais podem ser utilizados em outras áreas ou ações. "Além de fortalecer os agricultores, o Programa promove a qualidade e a variedade dos alimentos para as pessoas abrigadas e às famílias atendidas, promove o empoderamento das mulheres e comunidades quilombolas, e elimina o atravessador", avaliou Longaray.
O técnico da Emater, Robson Loeck, explica que a relação direta reduz o custo, aumenta a qualidade dos alimentos que chegam às mesas, a renda do produtor, mantém os recursos na região, e reduz o êxodo rural e suas consequências. Nas compras tradicionais os alimentos podem vir de qualquer lugar do país. Às vezes passam dias nas estradas. Para que aguentem viagens longas são utilizados aditivos químicos. Com os alimentos comprados na região isso não acontece, o que evita vários problemas de saúde.
Dos quilombos para a mesa
Um dos grupos responsáveis pela entrega ao PAA é composto de integrantes de comunidades quilombolas - Alto do Caixão, do Algodão e Vó Elvira. Eles produzem sem o uso de agrotóxicos e alguns têm certificação de produto orgânico. Para enriquecer a terra, em vez de usar adubos químicos, usam esterco e folhas decompostas. Quando surgem pragas, o problema é combatido com chás de hortelã ou urtiga. "Aí não tem problema, a gente pode consumir", explica Diana Willrich. Para ela, se os pais comerem bem, os filhos também comerão. "E os netos, bisnetos, tataranetos...", garante, ao apostar em uma mudança de cultura para as futuras gerações.
Diana vive com o marido, três filhos e os sogros. No PAA é responsável pela entrega de beterraba, cenoura, pepino e laranja. Mas na propriedade encontram-se muitas outras culturas. Dali sai quase toda a alimentação da família. Filha de agricultores, Diana nasceu na Zona Rural e garante que de lá não sai. "Da colônia eu só saio pro chãozinho (referindo-se à morte). Cidade é só pra passear e olhe lá", diz.
Os filhos estão em harmonia com a mãe. O mais velho, de 16 anos, pretende fazer um curso de mecânica e atuar no local. O do meio, com 11 anos, sonha em estudar no IFSul Campus Visconde da Graça e voltar para aplicar o aprendizado nas terras da família. Apenas o de seis anos, ainda não traçou os planos futuros.
A venda é uma dificuldade comum entre os agricultores. Muitos entregam a atravessadores, por vezes sem poder discutir preços ou prazo de pagamento, além de não saberem antes o que será solicitado. O ingresso no PAA reduziu o problema. Eles sabem o que precisam entregar e quanto receberão.
Adriana Lacerda Siqueira produz alface, tempero verde, couve e abóbora para o Programa. Ela conta que sempre sonhou em ter uma horta e em 2013 acessou recursos do governos federal - Programa de Fomento Produtivo às Atividades Rurais - com projeto da Emater. Inicialmente era produção para subsistência, depois conseguiu produzir mais e poderia vender o excedente. "Eu não conseguia vender pra ninguém. Dava pros vizinhos", diz. O PAA se tornou um importante aliado na venda.
O presidente da Associação do Quilombo do Algodão, Nilo Dias, produz para o Programa abóbora, batata e cenoura. Mas sua propriedade tem outras culturas, como o amendoim. Ao ser questionado se o grão era consumido no domingo, disse: "Não. Pra dia de chuva. Aqui na colônia a gente não tira férias, mas dia de chuva a gente não trabalha", afirmou, sem parecer considerar trabalho a preparação dos alimentos para o transporte, o debulhar dos grãos, a preparação das mudas e tantas outras tarefas feitas, também, em dias de chuva.
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