Saúde
Uma batalha pela vida mais frequente?
Pacientes dão exemplo de garra para enfrentar o câncer que cada vez mais afetam os jovens
Uma vida recomeçando e outra prestes a começar. Em comum entre a empresária Priscila Bellomo e a servidora municipal Sheila da Silva não é apenas o tipo de câncer enfrentado, mas a virada de chave na vida após o diagnóstico. Cada vez mais presente entre pessoas mais jovens, o câncer, um termo que abrange mais de cem tipos de doenças distintas - neoplasias malignas e tumores malignos - e, em um primeiro momento assusta, pode ter um diferencial na hora de conquistar a cura, conforme a maneira com que você o enfrenta.
Pelo menos, é assim que Sheila, aos 40 anos, vê a batalha contra o câncer de mama, quase meio ano após o diagnóstico. A pandemia e o abalo com uma amiga internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) com Covid-19 (e logo o luto) tornaram-se prioridades ante o aparecimento de um nódulo, notado durante um autoexame.
"Quando eu fiz esse autoexame, eu senti que eu estava com um nódulo um pouquinho diferente do que costumava ter com esse hormônio que eu estava tomando [para endometriose], vi que ele era mais denso, que era um pouquinho maior, que ele estava um pouco mais aderido à mama. Como eu tenho pouco seio, eu senti que estava grandinho e que não era simplesmente um cisto hormonal", conta.
Com um foco maior na situação da amiga, Sheila acabou postergando a ida ao médico. Até que em 15 dias, ela viu que o nódulo tinha dobrado de tamanho. "Aí pensei 'olha, por mais que tenha a pandemia, eu preciso da médica urgente', eu sentia que não era um cisto, é diferente. No que a médica tocou, ela sentiu que era alguma coisa diferente", comenta.
"Eu já sentia no meu corpo, que tinha alguma coisa errada, que era mais que hormonal. A médica, fazendo exame, já disse que era algo a se tratar e fazer cirurgia. Na minha cabeça eu já sabia que era câncer, naqueles poucos dias eu já estava com outros sintomas, como cansaço. Quando recebi o resultado, perguntei 'então tá, o que a gente faz agora?'", diz Sheila.
Depois da notícia, iniciou-se uma corrida contra o tempo. Pensando em buscar aliados para a medicina - quimio e radioterapia -, a servidora municipal começou um maior cuidado com o psicológico, alimentação, hidratação e também dar caminhadas e fazer alongamentos. Ela destaca que nem sempre é fácil. O sentimento de fragilidade e o cansaço aparecem de vez em quando. "Mas quanto mais eu me deixar fragilizar, pior é, mais dor eu vou sentir, mais frustrada eu vou ficar, estou tentando buscar formas de passar por esse processo da melhor forma possível".
"Eu não me alimentava tão mal, me cuidava um pouco, mas vamos melhorar isso. Nunca tive problema de tomar água, eu tomo com vontade. Atividade física que é mais o meu problema, mas eu tenho feito meus alongamentos, faço algumas coisas que estão dentro do que posso fazer, porque, claro, as células saudáveis são atingidas pela quimio, né?", compartilha.
Questionada sobre a queda de cabelo, Sheila afirma entender que isso, para algumas mulheres, é a pior parte, mas não para ela. "Eu rapei o cabelo antes, porque eu estava louca para ver como é que era, porque eu nunca tive problema com meu cabelo", fala enquanto mostra à reportagem a cabeça careca. Desde o início do tratamento até agora, o tumor já reduziu de tamanho 50%.
"Notícia a qual eu já temia"
Em Priscila não foi um nódulo que denunciou o tumor, mas sim uma coceira seguida de vermelhidão abaixo do bico do seio. Após a drenagem, realizada em um hospital de Pelotas, a expulsão de um pus fez com que a busca por um mastologista fosse necessária. Aos 34 anos, a investigação sobre o que poderia estar ocorrendo com os ductos mamários resultou na descoberta do tumor.
"Receber o resultado foi muito impactante porque passa muitas coisas na cabeça: 'vou morrer', 'por que comigo?' 'o que vai ser de mim?' 'vou ficar horrível, meu cabelo vai cair?'. Mas nada estava perdido, o meu médico me passou segurança, porém disse que teria que fazer biópsia. Quando soube que era maligno, aí sim eu desabei, fiquei estressada, nervosa, chateada, irritada", desabafa Priscila.
Para ela, que encerrou 2021 curada do câncer de mama, o tratamento foi bem difícil de fazer e de aceitar. A queda do cabelo foi rápida. Para evitar o crescimento do tumor e metástase, logo após as sessões de quimioterapia, houve a retirada dele. Ela avalia que, mais difícil do que perder o cabelo, foi lidar com a autoestima. "Fiquei horrível, inchada, sem cabelo, passando mal, triste, isolada das pessoas para poder me recuperar".
"Meu sentimento foi de que eu ia ficar debilitada, mas não poderia perder as forças porque tenho uma família linda, um filho adolescente que estaria ali comigo neste processo delicado. Meu filho disse 'cabelo nada mais é do que um enfeite que temos em cima da cabeça, não é por isso que não vamos te amar'", acrescenta.
De mulher para mulher
Priscila Bellomo
"Quero dizer às mulheres que estão passando por este momento: seja forte. Mais importante é confiar em Deus, em nós mesmas, que essa doença não vai vencer, que você vai passar por isto. O tratamento pode ser longo e demorado, não é fácil, mas temos a oportunidade de ficar boas. Sempre agradeço a Deus por tudo, faço meu tratamento ainda com medicação durante cinco anos. Hoje posso dizer 'não deixe o câncer tomar conta de você, faça com que você tome conte dele para que ele vá embora'. Perder cabelo acaba com a autoestima, mas isso a gente supera".
Sheila da Silva
"A gente tem que fazer aquilo que está dentro do nosso alcance sempre e, aquilo que não tiver, a gente entrega. Mas a gente tem que aceitar, né? Não se acomodar, aceitar. A gente adoece muito a família se se deixar abater. Todo mundo que está ao redor, então eu digo que se eu sentir dor, eu vou reclamar de dor, se eu não me sentir bem, vou dizer, mas por que vou dizer isso se eu não tiver?".
O câncer está mais presente na sociedade?
De acordo com a médica oncologista, Cristiane Petrarca, o câncer vem aumentando mundialmente e vários estudos e teorias vêm sendo desenvolvidas. "Outro fator é que alguns tipos de tumores, principalmente câncer de mama e de intestino, estão se apresentando em idades precoces do que em décadas anteriores", adianta.
"Vários fatores vem sendo levantados, como o tipo de vida, a exposição ambiental que a gente tem, as questões tanto de poluição quanto de alimentação que nós temos e também a questão do diagnóstico mais precoce, que cada vez mais a gente consegue ter, o que antigamente era menos possível".
Ela diz que, por ser uma doença multifatorial, o nível de sobrecarga emocional, física, pouca atividade física e o aumento da obesidade são fatores que estão diretamente relacionados ao desenvolvimento de praticamente todos os tumores. Além disso, a médica que também é professora na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) defende que é pouco provável que uma causa seja capaz de desencadear o câncer. "Claro que existem fatores hereditários, mas esses correspondem a aproximadamente 15% dos tumores".
Uma alimentação equilibrada, sem dietas restritivas ou suplementação vitamínica desnecessária, realização de atividade física que, para a profissional, é "um remédio que todos deveriam fazer diariamente", além da maior periodicidade dos exames de rastreio, como mamografia, ecografia, exame clínico ou o papanicolau são formas de evitar o desenvolvimento da doença ou, no caso dos exames, diagnosticá-la precocemente. "O tratamento na situação metastática e disseminada já não tem a possibilidade de cura ativa na maior parte das vezes, mas tem a possibilidade de controle, de redução da lesão tumoral, de redução da atividade da doença, de sintomas e, objetivando, principalmente, ganho de sobrevida e de qualidade de vida", ressalta Cristiane.
"O apoio da família, a espiritualidade, estar acompanhada por um médico oncologista, um médico especialista em tratamento de câncer, são essenciais para que a gente possa ter um melhor resultado, um acompanhamento multiprofissional, nutricional, psicológico, suporte odontológico em muitas vezes, suporte de terapia ocupacional, fisioterapia, suporte de enfermagem são essenciais para que a gente possa melhorar os resultados terapêuticos ao decorrer do tratamento do câncer", recomenda a especialista.
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