Opinião

Feminicídio: as marcas que não se apagam...

Por Manoel Jesus
Educador
manoeljesus.blogspot.com

Existem dívidas sociais que são impagáveis. Quando, de alguma forma, se violenta uma criança, não é somente a marca física que fica, mas a percepção de que, pelo resto da vida, faltará alguma coisa, para a qual não há compensação, não existe remédio que cure... Foi o que pensei quando ouvi, já no final do ano de 2023, uma matéria sobre os órfãos do feminicídio. São as vítimas indiretas da violência, que registrou, no Brasil, em 2022, 2.529 casos. Aqueles que, de alguma forma, foram apagados socialmente.

Dos diversos depoimentos prestados por jovens e crianças, ficou a sensação de que, mesmo com a atitude do governo de alcançar um salário mínimo às crianças, o que se faz é minimizar, sem conseguir apagar os traumas sofridos e suas consequências. Doeu ouvir uma menina balbuciar: “eu não lembro do colo da minha mãe”. Perdeu um direito que não deveria ser negado a qualquer ser humano, independe da situação social, quando a vítima de assassinato é uma mulher, pelo simples fato de ser mulher.

O que levou um companheiro a tomar tal atitude é difícil de entender. Autoridades e especialistas dizem que se pode especular pelo ódio, o desprezo ou o sentimento de perda do controle e da propriedade sobre o elemento feminino. Comuns em sociedades marcadas pela associação a papéis discriminatórios machistas, como a sociedade brasileira. Vergonhosamente, o País é o quinto no ranking de homicídios de mulheres. Que pode resultar em morte, mas também tomar outros caminhos.

Mulheres, jovens e meninas submetidas à violência, por assédio, exploração sexual, estupro, tortura, violência psicológica, agressão por parceiro ou familiares, perseguição, feminicídio... Os agressores acham formas e intensidades, fazendo com que a violência de gênero se perpetue nos espaços públicos e privados, encontrando no assassinato a expressão mais grave, mas não única. Pelo menos uma mulher é morta a cada oito horas, sendo que 70% tinham entre 18 a 44 anos, ou seja, estavam em idade reprodutiva.

Seis crianças/adolescentes ficam órfãs do feminicídio no Brasil, por dia, o que tem sérias consequências na capacidade do aprendizado, da estabilidade emocional e de relacionamento social. Elas ficam propensas à depressão, ansiedade, retraimento social, atitudes agressivas, tendências suicidas, evasão escolar, dificuldades de aprendizagem e comportamento regressivo. Mas também podem se sentir perdidas, confusas, divididas, obrigadas a intermediar conflitos ou a defender uma das partes.

Gabriel Fernandes, um menino, encolhido no chão, resumiu o sentimento pela perda da mãe: “você nunca vai ser a mesma pessoa depois do que aconteceu... às vezes você próprio não se reconhece como você mesmo”. Retirar da mãe a possibilidade de formar uma família é perder um arrimo da própria identidade. Apesar das dificuldades, hoje, de constituir uma família, ela continua sendo referência. Feminicídios são marcas que não se apagam. Na ausência, há um vazio de segurança e afeto. As mães podem ter ensinado praticamente tudo, mas não conseguiram que a gente aprendesse a viver sem elas...​

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