Editorial

Sobre dar valor ao trabalho

Tem sido tamanho o barulho acerca do projeto da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet - o popularmente chamado PL das Fake News - que, no meio de tanta gritaria, há pontos que acabam passando batido. Ou, no mínimo, sendo abafados pelos ruídos de quem pretende ver uma discussão séria como essa soterrada pela batalha de narrativas falsas e/ou exageradas. E enquanto se fala sobre “censura”, “Ministério da Verdade”, “fim da internet”, um dos aspectos deixado em segundo plano é a possibilidade de determinar que as gigantes plataformas online, as big techs, passem a pagar aos veículos jornalísticos e artistas pelos conteúdos que venham a utilizar.
Nos últimos dias, o movimento contra essa proposta ganhou corpo. Primeiramente, em articulação para que o trecho do PL 2630/2020 que trata sobre essa temática seja retirado do texto, tornando-se proposta à parte que, em tese, viria a ser discutida em segundo momento pelo Congresso. Nas entrelinhas, contudo, além da articulação para desidratar o projeto aos poucos para que, se aprovado, seja menor e menos abrangente, está a ideia de que, estando à margem, a remuneração de produtores de conteúdo vá sendo empurrada com a barriga, nos moldes daquilo que o Parlamento brasileiro tão bem sabe fazer.
Tal busca por impedir o pagamento pelo jornalismo e a arte ganhou reforço mais recente com a determinação recebida por muitos parlamentares para que refutem qualquer possibilidade de direito a remuneração das big techs às empresas e artistas que criam conteúdos. Aceno pesadamente reforçado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, que ordenou à bancada do PL que, em caso de votação, aja em peso contra a aprovação. O motivo: enfraquecer empresas jornalísticas que, sob sua ótica, o perseguiriam.
Não deixam de ser compreensíveis insatisfações com notícias e coberturas jornalísticas. Historicamente sempre houve bronca de fontes e personagens das reportagens quando o assunto não é favorável a estes. Mesmo que as informações estejam corretas, apuradas com profissionalismo e comprovadas pelos fatos, muitos dos que se veem diante do escrutínio público optam por atacar primeiramente o mensageiro, a mensagem e, por último (e nem sempre), o fato causador do relato. Contudo, uma compreensão é necessária: o jornalismo - assim como a arte - é essencial à sociedade. Mesmo quem o ataca é profundamente beneficiado por esse ofício. E como tal, como ofício que é, exercido com método e profissionalismo, não pode ser explorado sem valorização. Em comparação simples: ninguém entra no mercado, pega um item que alguém dedicou especialização, tempo e dedicação, e sai porta afora sem pagar, ainda mais com o ato aceito socialmente, aplaudido e incentivado.
Por que, então, quem produz jornalismo e arte, gera empregos e renda com isso, deve estar disposto a ter sua obra explorada sem direito a pagamento?

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