Tragédia

"Cena de guerra": socorrista pelotense descreve tragédia em Petrópolis

Morador da cidade carioca há 18 anos, Rodrigo Cunha dedica-se ao salvamento de pessoas após enchentes e deslizamentos

Divulgação -

As cenas do rastro de destruição causado pelas chuvas que devastaram a cidade de Petrópolis, no Rio de Janeiro, na última semana são assustadoras. Casas submersas, carros em cima de árvores e mais de cem mortes registradas mostram o tamanho da tragédia. Em meio aos profissionais que têm se dedicado ao salvamento de pessoas está Rodrigo Cunha, 33. Pelotense, mas morador da cidade na região serrana há 18 anos, o bombeiro, socorrista e fundador da Resgate Petrópolis descreveu ao Diário Popular como estão sendo os dias de busca por vítimas da enchente.

Entre chamamentos, pedidos por ajuda e deslocamentos entre as ruas, hoje tomadas por barro, destroços e ainda cheias de água, Cunha resume o ambiente na cidade como "cena de guerra". Embora já tenha atuado na linha de frente de salvamento após as chuvas que atingiram a cidade há dez anos, o socorrista conta que o visto hoje ao andar pelas ruas é assustador. "São muitos carros que não sabemos como foram parar naquele local, são casas destruídas e não é em um ponto só da cidade, são vários. Tu olha o desespero das pessoas porque não podem voltar às suas residências, está tudo condenado. Você vai no abrigo e vê as pessoas chorando porque perderam tudo e não vão poder voltar para tirar seus pertences e bens materiais que restaram", relata. Por outro lado, o bombeiro conta que, mesmo com o risco, há quem desafie as recomendações das autoridades e retorne às casas. "São pessoas que estão nas suas residências com medo de serem saqueadas, algo que está acontecendo muito."

Cunha já participou de cinco dias de buscas, incluindo ontem. Ele conta que com o passar dos dias, as buscas têm se tornado mais difíceis e desgastantes. Dentre os resgates, relembra a história de uma grávida de nove meses e uma idosa de cem anos, que saíram com vida após horas de espera por ajuda. No entanto, também as vítimas que não resistiram à tragédia também têm feito parte do trabalho diário, como uma criança de três meses e uma idosa, soterradas, e avó e neto de quatro anos cuja busca durou mais de oito horas e também não tiveram o melhor final.

Durante a tarde de ontem, o socorrista participava das buscas por jovens cujo ônibus que os transportava foi totalmente tomado pela água e tombou. "Tivemos conhecimento que o pai de um estudante que estava no ônibus estava procurando o corpo sozinho", relata. No vídeo enviado por ele, pessoas tentavam subir sob o automóvel e puxavam umas às outras, tentando fugir das águas.

"Não me sinto desamparado"

Cunha conta que para atuar em situações extremas como estas existe uma série de treinamentos, com instruções para área de risco. "É preciso pessoas capacitadas, pois a todo momento estamos em perigo, onde, por exemplo, pode cair uma casa, soterrando a todos."

Devido à incapacidade de deslocamento, o socorrista diz que a falta de acesso aos locais apresenta não só risco, mas também não permite que os responsáveis pelo resgate possam sair da área antes de finalizar o trabalho. "Nós não temos horário nem para tomar água. Não temos como descer tudo para almoçar, por exemplo", conta. Quem tem ajudado os profissionais é a própria população. Emocionado, Cunha conta que motoboys têm arrecadado mantimentos e se arriscado para levar o alimento até aqueles que buscam por vítimas. "É realmente emocionante. Afirmo que não passamos fome, não passamos sede, pois toda hora eles avançam até a zona quente, sem conhecimento da área de risco para levar mantimentos para que possamos continuar."

A vontade de ajudar ao próximo frente a episódios como este, fez com que em 2016 Rodrigo fundasse a Resgate Petrópolis, com a missão de treinar pessoas para realizarem atendimento voltado à mal súbito e trauma, além de buscas e salvamentos. Além de cursos, a empresa reúne um grupo de 40 voluntários, que neste momento auxilia os bombeiros. "É importante ter pessoas que atuem na área onde o bombeiro não atua". O deslocamento de mantimentos, a busca por pessoas feridas e o alocamento de famílias desabrigadas faz parte do auxílio oferecido por eles.

História cruzadas

A história do pelotense Rodrigo Cunha com a Petrópolis começa em 2004, quando foi ao Rio de Janeiro em busca de oportunidade. "Quando cheguei me deparei com diversas emergências, nas quais queria ajudar e não sabia como", lembra. O município já enfrentou casos de chuvas torrenciais e deslizamentos de terra diversas vezes, catástrofes que têm se tornado mais comuns nos últimos anos. A vontade de ajudar o próximo fez com que ingressasse no curso de Enfermagem, primeiro passo para o currículo que possui atuando como socorrista, bombeiro civil, técnico em segurança do trabalho, socorrista especializado em busca e salvamento, paraquedista e socorrista da Samu da capital.

Além da tragédia deste ano, que já vitimou mais de 180 pessoas e possui centenas de desaparecidos, Cunha atuou em 2011, quando enchentes atingiram Nova Friburgo, Teresópolis, Petrópolis e São José do Vale do Rio Preto. À época, a chuva deixou mais de 39 mil pessoas desabrigadas e quase mil mortos. Já em 2013, foi responsável pelo salvamento de três crianças após deslizamento de terra que as deixou soterradas. Na ocasião, o socorrista e outros dois agentes da Defesa Civil foram atingidos por uma barreira de terra, que vitimou seus dois colegas.

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