Confusão

A homenagem virou um problema

Placas com o nome de famílias e personalidades da Vila Maciel escritas incorretamente revoltam moradores

Gabriel Huth -

Uma homenagem aos moradores da Vila Maciel, 8º distrito de Pelotas, vem causando estranhamento. As pontes instaladas no local trazem o sobrenome de famílias da região. Algo comum, visto que elas moram moram lá há décadas, não fosse um detalhe: as palavras foram escritas conforme a pronúncia e apresentam erros de grafia.

As estruturas foram construídas pela prefeitura há cerca de seis anos. Lorena Kickhöfel sempre viveu na região. Antes dela, os pais e os avós também passaram toda a vida na Vila Maciel. Quando as obras da nova ponte estavam por terminar, funcionários da prefeitura estiveram em sua residência para falar sobre a homenagem. "Antes, as pontes não tinham nome", lembra.

No início a iniciativa agradou, mas quando a placa foi instalada veio a surpresa. Em vez de Kickhöfel, forma correta de escrever o nome, lê-se Quiqueve. O erro causou indignação em alguns membros da família e os levou a reclamar aos órgãos. "A prefeitura disse que tinha a lista com os nomes certos", conta Lorena, relembrando o período em que os funcionários foram visitá-la.

Um pouco mais adiante há a ponte sobre o arroio Julho Bartz - alguém que nunca existiu. Paulo Ricardo Grupelli, proprietário de um empreendimento na região, acredita que houve confusão entre dois moradores conhecidos no local: Júlio Radtke e Edgar Bartz. Radtke possuía uma casa de jogo de bocha, lugar bastante conhecido nas redondezas. A família Bartz é a fundadora da empresa Tordilho Alimentos. De acordo com Grupelli, a intenção da prefeitura era homenagear os Bartz.

Apesar da intenção, a placa foi instalada próximo à propriedade dos Radtke. Quem explica é Wilson Pautz, morador da região há 40 anos. "A casa do Bartz é bem mais longe daqui", afirma. Pautz ainda recorda o dia da inauguração da sinalização. "Foi um fiasco. Estava tudo errado", comenta.

Do erro, um estudo
Intrigado com o caso, o licenciado em Letras Tiago Kickhöfel fez uma pesquisa relacionando o aprendizado de sala de aula com a mudança na grafia dos nomes. Usando a teoria Sincronia e Diacronia, de Ferdinand de Saussure, conhecido pesquisador na área da linguística, buscou mostrar um momento sincrônico desses termos. A diacronia é o estudo da transformação das palavras ao longo do tempo. "Um bom exemplo é a expressão 'vossa mercê' que, ao longo dos anos, sofreu alterações até virar 'você'", explica Tiago.

Já sincronia é o estudo de um desses momentos da linha cronológica de transformação dos vocábulos. Foi esta linha que Tiago seguiu. O autor do estudo não acredita que os nomes em questão acabem se adaptando ao mesmo formato encontrado nas placas. "Encaro como um fato bem isolado", analisa. A revolta dos "homenageados" é, para ele, relacionada a uma certa displicência por quem confeccionou as identificações. "Se fossem famílias mais influentes no cenário municipal, as palavras estariam certas", pontua.

O trabalho foi feito em 2012, enquanto Tiago ainda era aluno da Universidade Federal de Pelotas, e apresentado durante uma semana acadêmica da Faculdade de Letras. Para o curso, ficou a lição de que é possível unir a teoria à prática. "Nesta área as questões não são próximas da realidade", observa. Além disso, o nicho do imaginário linguístico, abordado no estudo, ainda é pouco explorado pela academia. A pesquisa chamou tanto a atenção que alguns professores ofereceram bolsas de estudos para o então aluno seguir as pesquisas.

O que diz a prefeitura
O secretário de Desenvolvimento Rural, Jair Seidel, desconhece o problema. Apesar disso, comprometeu-se a enviar uma equipe ao local na próxima semana, para averiguar a situação e conversar com os moradores. Se houver interesse da comunidade, a secretaria irá alterar o adesivo que cobre a sinalização e grafar os nomes corretos. O prazo para a conclusão dos trabalhos é de cerca de um mês.

 

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