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Consun da UFPel rejeita mudança na Epidemiologia
Unidade, reconhecida internacionalmente por suas pesquisas em saúde coletiva, quer se tornar instituto para ter mais autonomia
Carlos Queiroz -
O Conselho Superior da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) rejeitou a proposta de transformação do Centro de Pesquisas Epidemiológicas Professor Amílcar Gigante, referência internacional em saúde coletiva, em instituto. De acordo com o professor emérito e pesquisador César Victora, o Centro não existe oficialmente na estrutura da UFPel. Seus docentes são vinculados a departamentos de quatro cursos (Medicina, Odontologia, Educação Física e Nutrição), cinco deles se aposentaram ano passado e mais dois saem em 2018. Com isso fica ameaçado o futuro da unidade, pois as vagas abertas são ocupadas nos departamentos de origem dos profissionais.
Victora salienta que ele próprio é aposentado e sua vaga voltou para o Departamento de Medicina Social, que em seu lugar contratou um clínico para o posto de saúde. “Todas as vagas não estão voltando para nós. Eu acho que há uma ideia de que por ser muito produtivo e conhecido, o Centro não precisa do repasse dessas vagas”, comenta.
Em 2016, três jovens doutoras em Epidemiologia formadas pelo Centro, que tinha interesse em mantê-las, foram contratadas pela Universidade de Bristol. “Quem se forma aqui não fica desempregado. Não estamos conseguindo sangue novo”, diz, ao se referir à intenção do Centro, de poder contar com pesquisadores mais novos, já que a geração que criou a unidade está se aposentando e o Centro está ameaçado de extinção.
Para Victora, o Consun não teve a visão e a grandeza de priorizar o grupo que mais projeta a Universidade e se ateve a questões burocráticas menores. Observa que essa aprovação foi obtida anteriormente em várias instâncias da Universidade, pois há cinco anos os pesquisadores do Centro tentam a transformação. Salienta que os professores preferem que as vagas sejam supridas em seus departamentos a repassar para o Centro. “Se fosse em qualquer outro país a universidade não colocaria empecilhos”, afirma.
O que poderia ser feito como Instituto
O pesquisador explica que como Instituto de Epidemiologia haveria autonomia para expansão e poderiam ser criados novos cursos. Ou seja, o Centro poderia administrar seu próprio negócio. Também vislumbra colocar a Epidemiologia como disciplina nos cursos de graduação que manifestarem interesse. “Em outros lugares faz parte da formação básica, pois estimula o raciocínio, o pensar”, explica, ao ressaltar que há intenção de investir nos cursos da UFPel, mas ficam engessados, pois não têm como oferecer para o curso que não é de seus respectivos departamentos.
Com relação à parte financeira, nada mudaria, pois o Centro não depende de recursos da UFPel. Sempre conseguiu verba de fora. Poderia, sim, melhorar a visibilidade da Universidade. Observa que no Brasil existem três cursos na área de Saúde Pública e Epidemiologia com nota sete na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), um deles o de Pelotas e os outros dois são institutos. A criação do instituto é uma maneira de viabilizar que cursos de excelência se estruturem.
Reitor é favorável
O reitor da UFPel, Pedro Hallal, egresso da Epidemiologia, é favorável à proposta e frisa que foi o único gestor a encaminhar a pauta ao Consun. Não esconde sua indignação perante a atitude de 17 pares de membros, titulares e suplentes, que não compareceram à reunião da última segunda-feira, quando houve a votação. Para ser aprovada, precisaria de dois terços de votos favoráveis, mas dos presentes, 26 aprovaram a ideia, oito se manifestaram contra e 11 se abstiveram.
“Lamentavelmente não se fizeram presentes, mesmo o Consun sendo preponderante a qualquer atividade acadêmica da Universidade”, fala. Anteriormente ocorria falta de agilidade, por entendimento diferente da gestão anterior, mas essa “tocou” a pauta, frisa. Hallal se diz totalmente a favor da proposta e lamenta o posicionamento conservador dos que discordam.
A Epidemiologia, frisa o reitor, dá a maior contribuição que a Universidade tem, pois avança em nome da instituição em nível nacional e internacional, estando na iminência de ter o primeiro pesquisador brasileiro indicado ao Prêmio Nobel, que é César Victora. “Por questões menores, como vagas e recursos financeiros, talvez tiveram dificuldade em analisar a dimensão dessa proposta para a UFPel”, salienta.
O reitor lembra que pode haver recurso e que sua expectativa é de que, se isso ocorrer, os membros do Consun reavaliem sua posição, valorizem seus assentos e se posicionem. “Todos são eleitos e ocupam um espaço, e o mínimo que se espera é que compareçam às reuniões mensais”, acentua.
Mudança inviabilizaria departamentos
Diretor do Instituto de Biologia, professor Althen Teixeira Filho ocupa uma cadeira no Consun e votou contra a proposta, mas diz que a análise não pode ser feita de forma simplista. “Não sou contra”, garante, ao ressaltar que a situação financeira da Universidade impede hoje a transformação. Segundo ele, não há professores em número suficiente para atender a atual demanda. No próprio Instituto de Biologia são 15 docentes que podem se aposentar, inclusive ele, que já poderia estar parado há cinco anos. Entende que a criação do Instituto de Epidemiologia poderia inviabilizar o de Biologia de forma indireta. “Não sou contra porque os colegas são altamente qualificados, mas na situação que a Universidade está não poderia votar pela transformação. Seria irresponsabilidade minha”, fala, ao se referir ao déficit de docentes que se criaria, visto que os ligados ao Centro também têm vínculos com outros departamentos. “Do Departamento Social da Medicina seriam retirados sete ou oito e para repor?”, indaga. Conforme Teixeira, a cada três aposentados, a Universidade repõe apenas um. Seria irracional e ilógico votar pela criação do instituto por conta da situação de pressão que a UFPel vive. “Só podemos esperar uma piora”, acrescenta. Destaca ainda que no orçamento da União do ano passado apenas cerca de 4% foram destinados à educação. “Estamos sendo assaltados pelo sistema financeiro”, finaliza.
Saiba mais
O Centro de Pesquisas Epidemiológicas se dedica principalmente à investigação da influência dos fatores inerentes ao período do nascimento e dos primeiros anos de vida sobre a saúde do indivíduo durante toda a sua existência. Busca conhecer o estado de saúde das populações; identificar as causas das principais doenças presentes nesses grupos e desenvolver estratégias preventivas que beneficiem o maior número de pessoas. (Fonte: site do CPE)
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