Enchentes

O pouco que mudou na Colônia Z-3

Mesmo com parte da água baixando no final de semana, população segue ilhada; com poucos servidores, CRAS e abrigo apresentam leve melhoria de organização

Foto: Volmer Perez - DP - Moradores circulam de barco pelo bairro e tentam salvar o pouco que restou nas casas

Se na semana retrasada o caos estava instaurado na Colônia Z-3, como mostrou a reportagem do Diário Popular do dia 17, o cenário pouco mudou de lá para cá. Mesmo com as águas baixando e uma organização mais efetiva do poder público, a população local convive entre a sujeira, dificuldades de locomoção e falta de privacidade.

Há 10 dias, os moradores reclamavam da falta de água nos centros de apoio, dificuldades em retirar os alimentos e de desorganização no abrigo municipal. Após a reportagem do DP, a prefeita Paula Mascarenhas (PSDB) foi até o local e, na semana seguinte, anunciou que medidas seriam adotadas.

Na última sexta-feira, o DP esteve novamente no abrigo, localizado na Paróquia João Paulo II, e no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), na mesma quadra. Apenas três servidores estavam trabalhando no CRAS, para prestar o atendimento a uma comunidade de milhares de pessoas, que estão vivendo em barcos, no abrigo, ilhadas em casa ou tiveram que abandonar a Colônia.

O CRAS permanece aberto de manhã até o meio da tarde e estava lotado. Um dos servidores relatou que tem dormido lá, porque não há tempo de ir para a casa. O semblante dos funcionários era de cansaço total e havia muitas pessoas pedindo ajuda e queixando-se com a demora para ter o atendimento. Sem a ponte de acesso em direção ao Balneário dos Prazeres, o único caminho à Z-3 é pela Zona Norte, que só pode ser feito por veículos pesados e demora mais de duas horas, pelas péssimas condições da estrada.

Na sexta-feira, o servidor virtual estava fora do ar no CRAS e o Cadastro Único não estava sendo feito. Ainda assim, o operador de máquinas Éder da Silva Jacinto esteve lá para ser atendido e solicitar as cestas básicas. “Estou na casa do meu amigo que é numa parte mais alta, da minha casa não deu pra aproveitar nada, coloquei a geladeira para cima e tirei minhas roupas”, lamentou Éder. “A gente está ilhado. Agora, os auxílios do governo federal e estadual vão dar uma ajuda”, completou.

O Ministério Público Estadual (MP) tem monitorado a situação na Colônia Z-3, cujo abrigo é o que apresentou maiores dificuldades para ter uma rotina organizada. Mais de uma vez o MP aconselhou a Prefeitura a deslocar mais servidores para atuar no local, no abrigo e no CRAS, e o número ainda é considerado insuficiente. Um integrante disse, inclusive, que o MP ofereceu ajuda com seus servidores para fazer o Cadastro Único dos moradores, requisito para ter acesso aos benefícios estaduais, mas o Executivo teria alegado “não ter necessidade”.

No abrigo, que antes estava em situação de completa desorganização e sujo, o cenário melhorou com a presença de servidor da Assistência Social. Os próprios moradores se organizam para fazer as atividades de dia a dia, como limpeza e alimentação. “É bom porque aí a gente tem com o que se entreter”, diz o prestador de serviços, Ronaldo Bezerra da Silva, 32 anos.

Ele e esposa, a pescadora Vilsiane Alves Gomes, 32, estão há 20 dias no abrigo municipal - que tem mais de 150 pessoas. A casa deles, na beira da Lagoa, foi completamente destruída pelas águas. “A água chegou a mais da metade da parede, e é uma das casas mais altas”, relata Ronaldo. É a primeira vez que a casa deles alaga. “Todo mundo se levanta às 8 horas pro café, arruma as camas, os voluntários ajudam na cozinha. A gente fez uma lista para cada um limpar o banheiro um dia”, explica Vilsiane sobre a rotina no abrigo.

A falta de privacidade é um problema enfrentado pelo casal, que está com os três filhos lá. “É o mais grave, o mais brabo. Tem briga de criança, os adultos têm que intermediar e não podemos brigar entre nós, porque aí vira confusão total”, diz Ronaldo. “Tem a lista de limpeza, mas tem quem é folgado e não faz nada”, completou Vilsiane, cujo irmão não quis ir para o abrigo e montou uma tenda ao lado para ficar com a mulher e os filhos - outros moradores também fizeram isso.

Apesar dos percalços e desentendimentos, o clima no abrigo durante o dia é de camaradagem, com as crianças brincando e rindo, voluntários tocando violão e ajudando nos afazeres, e uma funcionária da Assistência Social gerenciando. Um morador, inclusive, levou uma televisão de tubo, de 14 polegadas, e muitos assistem juntos. As camas são coladas umas às outras, o pequeno canto que cada família tem para si.

Nas ruas da Z-3, a água que quase inundou o CRAS recuou um pouco na sexta, deixando vegetação morta, entulhos e sujeira pelo caminho. A maioria das ruas, no entanto, mais parecem canais, pelos quais os barcos ocupam os lugares dos carros como meio de transporte. O Corpo de Bombeiros e o Exército mantêm regularmente ações na Colônia. Lourival Miranda, militar que se criou na Z-3, tem o “sentimento de derrota” enquanto dirige o barco dos Bombeiros que leva mantimentos aos pescadores. “A gente vê essa situação de destruição, toda a memória de infância e da minha vida que foi afetada. É chocante”, relata.

Integrante do Corpo de Bombeiros, Lourival vive, no entanto, com a expectativa de que seus antigos vizinhos deem a volta por cima. “A gente sabe que o povo daqui é bem batalhador e não é a primeira vez que sofre uma calamidade dessas, mas dessa vez é a pior. Agora é esperar que sejam feitos estudos para que a nova geração não venha a sofrer tanto. O povo de hoje aprende para poder melhorar o futuro.” ​

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