Prejuízo

Safra do camarão começa com clima de pessimismo

Abertura da temporada do crustáceo acontece nesta quinta, mas os pescadores não têm as melhores expectativas após excesso de chuvas

Foto: Jô Folha - DP - Elevação da água doce obstruiu a entrada de água salgada vinda do mar

A ideia de uma boa temporada de produção do camarão segue frustrada para os pescadores da metade sul do Estado. O período liberado para a pesca do crustáceo foi oficialmente aberto nesta quinta-feira, 1º de fevereiro, e vai até o dia 31 de maio. Porém, nem mesmo com a sazonalidade ideal para a captura, os cenários melhoram. Por conta do grande volume de chuvas que atingiu o Estado na última primavera, houve um aumento do nível das águas da Lagoa dos Patos. Essa elevação da água doce obstruiu a entrada de água salgada vinda do mar, impedindo o desenvolvimento do camarão na lagoa. Inclusive, por isso, o tradicional evento de abertura da safra não ocorreu neste ano.

A frustração é visível no semblante de Aílton Vieira, 71 anos, que embora não esteja mais envolvido com a lida da pesca, acompanhava na manhã de quarta-feira (31) o pequeno movimento de embarcações no cais da Colônia de Pescadores Z-3, em Pelotas. Seus filhos também seguiram o caminho da pescaria, e com base no que o homem observa rotineiramente, conta o quão desanimadora está essa temporada. "Já esteve boa. Agora deu uma caída, porque geralmente quando a água dá esse movimento de salgar e não salgar, a pesca dá uma baixada. [...] A água salgada entrando, entra o camarão, a tainha… coisas que agora não têm", afirmou o ex-pescador, experiente na função. "O que está dando agora é a corvina", afirma sobre o que se extrai da lagoa.

Outros pescadores que circulavam pela beira do canal de acesso à colônia também comentaram sobre as expectativas frente à baixa produção. "Tem que deixar a água salgar para se falar em camarão", disse o pescador Guaraci Oliveira, 61 anos. Ao lado do colega de profissão, Rudinei Oliveira, 57 anos, que compartilha da mesma visão, aponta a realidade da lagoa em poucas palavras. "Água doce não tem peixe. A lagoa vive só de água salgada", ressaltou Guaraci. Agora, dependendo do andamento do clima nas próximas semanas e do volume de chuvas, os homens enxergam um panorama melhor para a pesca de outros peixes, talvez apenas para o mês de março. "Não tem o que pescar. A maioria está tudo parado aí. A pesca aí só de embarcação pequena", aponta Rudinei.

Associação de pescadores

De acordo com Ivan Kuhn, presidente da Colônia de Pescadores Z-8, de São Lourenço do Sul, não existem perspectivas para o camarão na lagoa para este ano, pois as chuvas na primavera atrapalharam o desenvolvimento do crustáceo. Segundo ele, a parte baixa da lagoa, próximo a São José do Norte, ainda pode apresentar alguma produção até o mês de maio, quando fecha a temporada, mas apenas isso. "Só nos resta a tainha. E também a corvina, até março".

Conforme explica o professor do Instituto de Oceanografia da Furg, Luiz Felipe Dumont, existe um ciclo de vida do camarão-rosa. O período de crescimento das larvas deste crustáceo, vindo da costa de Santa Catarina, acontece dentro do estuário, que é a Lagoa dos Patos. "A desova em Santa Catarina, as larvas descem para o sul, entram nos estuários, viram juvenis, crescem, são exploradas pela pesca, e aqueles que sobrevivem retornam para a região marinha", esclareceu o especialista.

O que acontece é que a quantidade de chuvas influencia na entrada das larvas no estuário, já que toda água no estado escorre até a lagoa. "Funciona como uma mangueira ligada, bombeando água doce da Lagoa dos Patos em direção ao oceano", comparou o professor. Essa força de água é maior do que a capacidade que a larva do camarão tem de entrar, impedindo, então, que ele se transponha para a lagoa. Em anos de seca, a produção de camarão ganha destaque, pois o nível da água dentro do estuário é menor que o do mar, facilitando a entrada da água salgada e também das larvas. "O cenário é pouco promissor, por tudo que já conseguimos monitorar e coletar de informação até agora. Caso haja uma mudança significativa do cenário ambiental e a água salgada comece a entrar com intensidade na lagoa, ainda assim a safra vai ser muito tardia e possivelmente não vai atingir o tamanho comercial", concluiu.

Posicionamento da Prefeitura

Em nota, aa Prefeitura de Pelotas, na terça-feira, o vice-prefeito e secretário de Desenvolvimento Rural, Idemar Barz (PSDB), lamentou o rigor climático de 2023 e seus prejuízos. "Como Poder Público, mantemos apoio e incentivo aos nossos pescadores artesanais e o Comitê Gestor das Feiras de Pescado em Pelotas, que atua com a participação da Prefeitura, Emater, Vigilância Sanitária da Secretaria de Saúde (Visa/SMS), colônias de pescadores, associações dos pescadores feirantes da Z-3 e Balsa e Sindicato dos Pescadores da Colônia Z3 já está com reunião marcada para o dia 23 de fevereiro, para definições sobre a feira durante a Semana Santa", disse.

Problemas no canal de acesso

Um dos pescadores apontou a necessidade de dragagem urgente do Canal da Divinéia, onde há cerca de 60 metros de extensão carentes de desassoreamento. Desde as enchentes de setembro, o acesso de embarcações ao cais da Z-3 ficou dificultado pela pouca profundidade da água. Atualmente, apenas embarcações de pequeno porte conseguem transpor pelo canal sem grandes problemas. "A gente não consegue sair. Quando sai, é quebrando hélice, entortando o eixo da embarcação", contou um dos moradores.

Conforme Barz, um amplo serviço de limpeza do canal da Divinéia foi feito no início do ano passado. Até então a SDR não recebeu nenhuma demanda recente, acerca deste serviço. Caso receba, será feito um estudo técnico para apurar a demanda. Também depende de análise e liberação ambiental.


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