Finalmente

Uma ferida de 50 anos

Formatura da Agronomia, vetada durante a Ditadura, ocorreu nesta quinta-feira em cerimônia na Faem

Paulo Rossi -

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Nas mãos. Ex-alunos e ex-professores receberam simbolicamente os diplomas (Foto: Paulo Rossi - DP)

Um grito permaneceu preso na garganta de estudantes de Agronomia por 50 anos. Era dezembro de 1968 quando a turma da Faculdade de Agronomia Eliseu Maciel (Faem) teve a formatura cancelada pelo regime militar. Na quint-feira (18), o grito ganhou os corredores do prédio e 30 ex-alunos conseguiram realizar a cerimônia de colação de grau. Um dia histórico para a Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e para a democracia e a liberdade, palavras essenciais na construção da educação brasileira. 

A formatura foi proibida após uma escolha democrática da turma. Em uma eleição entre os 52 formandos, Juscelino Kubitschek ganhou por maioria - lembra o orador Oswaldo Pitol, hoje com 74 anos. Na época, até mesmo Pelé recebeu quatro votos. A decisão dos acadêmicos afrontava o regime. JK, senador no período do golpe, teve seus direitos cassados por dez anos. Através de telegramas, o ex-presidente chegou a confirmar presença na cancelada colação. Mesmo não sendo um líder de esquerda, JK era visto como um inimigo da ditadura. A homenagem não envolvia crenças partidárias, lembram os formandos, na maioria aposentados. 

“Não gostávamos da ditadura. O que gostamos é da liberdade e da democracia”, manifestou o orador, hoje morador de Londrina, no Paraná. Ele também destacou que manifestações e greves eram proibidas e, já naquela época, estudantes lutavam por melhorias e para manter direitos. Pitol lembrou de reivindicações, como a de manter a alimentação gratuita no campus, quando a então Universidade Rural do Sul desejava começar a cobrar pelas refeições. “Era um monte de estudantes sem grana”, lembrou. 

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Vínculo. A turma mantém contato até hoje através do WhatsApp (Foto: Paulo Rossi - DP)

Dos antigos telegramas, a turma, com uma média entre 70 a 78 anos hoje se comunica através de um grupo no WhatsApp. Pelas peculiaridades do caso, o grupo se manteve unido com encontros de tempos em tempos. Hoje as reuniões são anuais e as conversas são diárias através do aplicativo de celular. O evento de ontem contou com a presença do único colega estrangeiro.

Nas lembranças do ex-prefeito de Canguçu, Nelson Grigoletti, também formando em 1968, caminhões do exército estacionaram próximo aos grandes jardins do Campus Capão do Leão. Num determinado dia, três professores foram presos. A liberdade, lembra, era restrita. “Quem era de esquerda se dava mal”. Quando o assunto avança 50 anos e chega-se ao momento político atual, a maior parte dos entrevistados continua crendo na democracia como melhor forma para a solução dos problemas do país.

Compromisso com a democracia
“Fica o aviso para que não se repita. Não aceitaremos qualquer tipo de flerte com a ditadura. Um dia emocionante para a UFPel”, declarou o reitor Pedro Curi Hallal, momentos antes do início da cerimônia, com juramentos, entrega de diplomas e discurso de professores homenageados. 

O reitor repudiou qualquer manifestação política que vá contra os princípios democráticos e de liberdade de expressão, fundamentos da educação pública na universidade. “Seremos resistência, como sempre fomos, a qualquer projeto que tire a autonomia. São cicatrizes deixadas nas pessoas há mais de 50 anos. Espero que o país não cometa este retrocesso”, finalizou e foi aplaudido pelo público. 

Além da cerimônia, organizada pelo curso e pela universidade, a turma ganhou finalmente um quadro de formandos num dos corredores e ainda visitou a paineira plantada como símbolo da turma.

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