Artigo

Barreto Bastos

Por Sergio Cruz Lima - Presidente da Bibliotheca Pública Pelotense
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Honesto, bom e inofensivo era Barreto Bastos, estimado corretor da praça do Rio de Janeiro, durante o curto e conturbado governo do presidente Manuel Deodoro da Fonseca, primeiro chefe de Estado da Velha República.
Nem muito alto nem muito baixo, cheio de corpo, fisionomia serena e modos tranquilos, Barreto tinha o hábito de andar com uma das mãos no bolso da calça e a outra empunhando um chapéu de sol, que adiantava um pouco para a frente, em forma de bordão. De origem portuguesa, muito embora vivendo há muitos anos no Brasil, de pronto a sua pronúncia denunciava-lhe a nacionalidade. Claro, barba cerrada e bigode rapado, Barreto Bastos trajava um chapéu de pelo de lebre, de copa alta, paletó preto, de alpaca, colorida gravata borboleta, calça e colete de brim branco e botina preta bem lustrada.
Conservando a plena consciência de seus atos, a sua primeira mania revelava-se todas as manhãs, antes das oito horas: apresentar-se na rua Direita, tirar o relógio e acertá-lo pelo indicador do observatório do Castelo. Mais adiante, relacionando-se com os jornalistas do Correio Mercantil, nosso herói entendeu que devia ser poeta, e deixou-se ser dominado por uma segunda vesania que o celebraria nas ruas da capital da República.
Os redatores da Folha tomavam largo pagode à custa do improvisado poeta de meia tigela. Rafael José da Costa, proprietário do jornal, franqueava-lhe as colunas, nas quais o novo poeta publicava as suas poesias políticas, deveras apreciadas pelos assinantes e o povo. Entre as inúmeras produções estapafúrdias de sua lavra, conquistaram justo renome várias Sátiras e Récitas, bem como esta, que fielmente reproduzo:
"São, mundo, carne, e diabo / Todos tres tem muito rabo / He precizo polhe os quiabo / Atado nos seus mui rabo.
Remedio na medicina he quiabo / Souces de sette fazem muito rabo / Apelicamos alguma piassabo / A ver se lhe atrancamos o rabo.
Longos e largos artigos tem rabo / Mas todos elles não desejam o cabo / Por que lhe fazem a conta no fiabo / Não desejam que tudo fique no cabo".
E assim, em um português macarrônico e manquitó, num ousio sem fim, Barreto Bastos sonhava em ser convidado para o ingresso em alguma Academia de Letras aturdida avec sa impudence.


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