História
70 anos do 'Massacre da Linha do Parque'
Episódio ocorreu em 1º de maio de 1950, em Rio Grande, e ocasionou a morte de cinco pessoas
A data de 1º de maio é considerada pelo Brasil e por outros países como o dia do trabalhador. Em Rio Grande, no entanto, esse dia também é lembrado por outro fato, ocorrido há 70 anos, que teve ampla repercussão durante o período e também repercute no momento atual. Conhecido como o massacre da linha do parque, o evento foi marcado pela morte de cinco pessoas, quatro manifestantes e um membro da Brigada Militar.
“Durante muito tempo não se falou de outra coisa na cidade”, afirma o professor de História, Lênin Landgraf, sobre a repercussão na época, em 1950. Landgraf estuda o acontecimento desde 2017, quando produziu um artigo científico. No ano passado passou a trabalhar novamente com o fato para o desenvolvimento de sua dissertação de mestrado, no Programa de Pós Graduação em História da Universidade Federal de Pelotas. Ele explica que a origem do massacre pode ser explicada a partir de um decreto do então presidente Eurico Gaspar Dutra, que determinou o fechamento da Sociedade União Operária (SUO), principal sindicato de Rio Grande no período e que era o local de organização dos trabalhadores. “A SUO, como era conhecida, tinha biblioteca, escola para os filhos dos trabalhadores”, cita o historiador sobre o local que estava fechado há cerca de um a dois meses antes do dia 1º de maio.
De acordo com Landgraf, a aproximação da data motivou a reunião de entidades sindicais e lideranças sociais do município, que decidiram promover uma comemoração em alusão ao dia do trabalhador. A festividade que contou com churrasco e manifestações políticas teve a participação de cerca de duas mil pessoas, que estavam no local que abriga o atual Parque do Trabalhador. “E após o churrasco, foi convocado por parte das lideranças que estavam no local, que se saísse uma passeata lá do parque até a Sociedade”, conta o historiador. Das duas mil presentes, de 600 a 800 pessoas participaram desse movimento. A manifestação foi interceptada pelo delegado Ewaldo Miranda, do então Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) que, com a presença de policiais, solicitou a interrupção do movimento. Com isso, foi iniciado um conflito. “A partir daí a brigada abriu fogo contra os manifestantes, alguns armados, também responderam”, afirma o mestrando. Cinco pessoas morreram, sendo quatro manifestantes: a tecelã Angelina Gonçalves, o pedreiro Euclides Pinto, o portuário Honório Alves de Couto e o ferroviário Osvaldino Corrêa, e um policial militar, Francisco Areia. Diversas pessoas também ficaram feridas, entre elas Antônio Réchia. “Uma das principais lideranças da cidade e do PCB acabou ficando na cadeira de rodas pelo resto da vida, com uma bala alojada na coluna”, conta. Após o incidente, Landgraf lembra que houve o fechamento da cidade por militares, que também sitiaram os hospitais onde eram tratados os feridos. Além disso, também foi aberto um processo-crime, que terminou sem a conclusão sobre culpados.
Marcas que permanecem
Conforme o historiador, o acontecimento foi relatado de formas diferentes por jornais comerciais, que condenavam a manifestação e os manifestantes, e por jornais operários da época, que condenaram a ação da polícia. Os periódicos são uma das fontes utilizadas pelo mestrando, que também analisa entrevistas feitas por outros historiadores nos anos 80 e 90, além do processo-crime. Landgraf afirma que ainda procura por pessoas que estavam presentes na ocasião, ou parentes, sendo estas uma das dificuldades do estudo. Outros fatores de difícil acesso, segundo ele, são a descoberta de informações das pessoas envolvidas, além do acesso aos jornais operários. A escolha do tema para a dissertação, disse o historiador, se deu pela escassez de trabalhos científicos sobre o assunto, além da possibilidade de promover uma lembrança dos mortos na ocasião e pelo que eles lutavam na época, citando a busca por mais direitos, pela liberdade sindical e de imprensa e pela democracia. “Acho que é fundamental que a gente não esqueça desses nomes, e que as próximas gerações também venham a ter acesso ao que foi o Massacre da Linha do Parque”, afirma.
Nesse sentido, ele lembra que as marcas do ocorrido ainda permanecem no município, com a nomeação de locais e monumentos. Os trabalhadores também são homenageados anualmente na data. Nesse ano, no entanto, os atos não acontecerão, devido à pandemia do novo coronavírus. “Mas que cada pessoa reflita sobre isso e busque entender um pouco mais sobre a nossa história riograndina, que é tão rica, e valorizar um pouco mais a nossa cidade”, observa.
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