Alerta
Profissionais da saúde viram alvo de violência
Pressão dos pacientes para que o SUS funcione, insegurança e atrasos salariais geram maior tensão
Gabriel Huth -
O cenário era para ser apenas de cuidados com a saúde. Não é o que acontece. Não raro, os plantões são cortados por chamados à Brigada Militar (BM). Acabam em ocorrências policiais. E os profissionais que estão de prontidão para atender à comunidade, muitas vezes, se veem espremidos entre dois tipos de violência. De um lado, os reflexos da insegurança pública, que os deixa na mira em situações como acertos de conta entre grupos rivais. De outro, a angústia de pacientes e familiares, que não sabem quando terão acesso a leitos, exames, consultas e cirurgias. É um contexto de tensão.
E os relatos em que os profissionais da saúde tornam-se vítimas de violência - psicológica e física - são cada vez mais comuns. Uma audiência pública no dia 6 de agosto, às 17h, colocará o tema em pauta, em Porto Alegre. A proposição, que coloca lado a lado representantes do Conselho Regional de Enfermagem (Coren) e da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, busca estender um apelo à população: “Queremos mostrar que nós também somos vítimas da desestruturação do sistema”, defende o presidente do Coren, Daniel Menezes de Souza.
Se a lógica de corte de investimentos públicos em setores como a saúde prevalece, os trabalhadores também sofrem os efeitos da precarização. Seja pela pressão da comunidade, que exige respeito a direitos constitucionais. Seja no bolso, com atrasos recorrentes no pagamento de salários.
Em busca de dados para traçar ações de combate à violência
Desde março, o Sindicato dos Trabalhadores em Serviços de Saúde (Sindisaúde) faz levantamento junto à categoria para quantificar os casos de violência em Pelotas e nos 11 municípios da área de abrangência. Um dos alvos para a apuração são as Comissões Internas de Prevenção de Acidentes de Trabalho, já que os episódios de agressão devem ser registrados. A maioria dos casos, entretanto, não são formalizados.
Um dos pontos não gera dúvida: os profissionais encarregados do acolhimento e da triagem dos pacientes são os mais vulneráveis aos ataques. E são, portanto, as equipes de Enfermagem - auxiliares, técnicos e enfermeiros -, que estão na linha de frente dos atendimentos, os mais atingidos.
“Os casos de violência são crescentes e preocupantes”, destaca a presidente do Sindisaúde em Pelotas, Bianca Macedo da Costa. E adianta: os dados devem ser encaminhados ao Ministério Público do Trabalho (MPT) e servir de base a tratativas com a patronal, para exigir providências. Mas, para isso, as denúncias precisam chegar ao Sindicato. E há pressa para isso.
Hoje os quadros de depressão têm gerado a maioria dos afastamentos dos profissionais de Saúde - acrescenta o presidente do Coren. São abalos emocionais que - associados ao receio de represálias - ajudam a entender os porquês de preferirem não se manifestar à imprensa. Nem com a garantia de ter a identidade preservada.
Pânico que afasta do trabalho
Diretamente afetada pelo desmonte do Polo Naval, Rio Grande teve um índice negativo do trabalho formal muito superior ao de Pelotas. A cada cem empregados formais rio-grandinos, 21 foram demitidos nos últimos três anos. Conforme o sub-coordenador do Observatório Social do Trabalho, o fim das montagens de plataformas afetou não apenas indústria metalúrgica, que contratava muita gente, mas também toda a cadeia de serviços envolvidos. Hilbert David acredita que as dificuldades em Rio Grande devem se manter em 2018. “Rio Grande vive uma realidade a parte por essa ruptura no Polo Naval. Já Pelotas, segue uma tendência nacional e estadual, com o comércio e serviços segurando uma certa estabilidade. Funcionam como um colchão da economia”, avalia o sociólogo.
Mapeamento do Simers
Em 2014, o Sindicato Médico do Rio Grande do Sul deu início à contagem de ocorrências de violência em instituições de saúde do Estado. Até julho de 2018 foram 94 casos; 58 em Porto Alegre e 36 espalhados pelo interior gaúcho. A maioria das situações envolve episódios no entorno, como tiroteios próximo a Unidades Básicas de Saúde ou ameaças e quebra-quebra dentro das UBSs para exigir agilidade nos atendimentos.
Violência também institucional
A dúvida sobre o recebimento dos salários e o endividamento forçado de milhares de profissionais da saúde Brasil afora também são apontados como violência. Quem destaca é o presidente do Sindicato dos Enfermeiros no Rio Grande do Sul, Estevão Finger da Costa, ao liderar inúmeros movimentos da categoria pelo pagamento em dia. “São situações que afetam a vida do trabalhador”.
A enfermeira da Santa Casa de Misericórdia do Rio Grande faz coro às palavras do presidente. “É um sentimento de revolta e desmotivação”, resume a jovem. É um cenário de inúmeras pressões em meio à crise na saúde: colegas demitidos, sobrecarga de trabalho, pacientes angustiados e a dúvida de quando as contas poderão ser pagas. “Com família e filho pequeno, não tem outro jeito. A gente vai usando o cartão e entra no limite do cheque especial”.
É a chamada violência institucional, que também faz vítimas, em meio aos recorrentes atrasos no repasse de verbas do governo do Estado aos hospitais.
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