Uma cerimônia ecumênica, realizada no último mês, ajudou a propagar a importância da doação de corpos para o ensino da Anatomia Humana. A Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pelotas (Famed/UFPel) mantém campanha desde 2015, mas apenas uma doação tem ocorrido por ano. O ideal era de que esse número fosse, pelo menos, quatro vezes maior, já que uma média de 800 alunos - de dez cursos diferentes - passam pela disciplina todos os anos. Cresce, portanto, o apelo à comunidade para que os corpos recebam um fim nobre e permitam a qualidade do processo de aprendizagem de centenas de acadêmicos que no futuro, como profissionais, terão o compromisso de salvar inúmeras outras vidas.

O uso de manequins e de maquetes é apenas ilustrativo. Com material grosseiro e sem as variações anatômicas, próprias da estrutura biológica real, ficam distante do que seria o melhor à formação dos estudantes. Servem somente como complemento às explicações. E mais: o estudo inadequado da Anatomia Humana pode ser comparado à situação da criançada que avança no Ensino Fundamental sem base sólida de alfabetização - ressalta o professor Carlos Alberto Tavares. A própria Sociedade Brasileira de Anatomia reforça: o ensino através de cadáveres é insubstituível.

“Os alunos têm que poder manusear. Têm que poder mexer neste corpo, senão não vão aprender”, enfatiza, com a propriedade de quem ministra aulas na Famed há 41 anos. E conta que os corpos chegam a permanecer mais de uma década como fonte de aprendizado. A renovação, entretanto, deveria ocorrer dentro de um prazo de cerca de dois anos.

Além de estudo, respeito
O rosto ainda traz traços da adolescência. Rafaela Schneid tem 18 anos e já está no 4º semestre da Faculdade de Medicina. O suficiente para ter se tornado monitora e falar com maturidade sobre o contato com os cadáveres, que geram muito mais do que conhecimento, no laboratório. “Passamos a desenvolver respeito, ao estar tocando um corpo”, lembra a jovem. “Não é só aprendizagem. É importante pra nossa formação ética porque conseguimos desenvolver sensibilidade, ao pensar que aquela pessoa teve uma história”, defende a acadêmica.
São mensagens que o professor tem procurado propagar às diferentes gerações. A cada nova doação que chega à Famed, Tavares repete sempre o mesmo ritual, ainda que não professe nenhuma religião. Antes de começar a preparar o corpo - com as soluções conservantes - sempre faz uma oração, em pedido simbólico para poder dar início a procedimentos e manuseios que, ao longo do tempo, permitirão formar novos profissionais da Medicina, da Enfermagem, da Nutrição, da Psicologia, da Educação Física... Para Pelotas. Para a região. Para o país. 

Saiba mais
- Quem pode doar?
Qualquer pessoa com mais de 18 anos de idade pode preencher o Termo de Intenção de Doação. O documento deve ser assinado por duas testemunhas e representará a vontade do doador. Mesmo com o formulário preenchido, a decisão final está nas mãos da família. Assim como nos casos de doação de órgãos, debater sobre o assunto é fundamental. Cópia do atestado de óbito também é essencial para formalizar a entrega do corpo à Faculdade de Medicina.

Em caso de desistência, basta entrar em contato com a secretaria do Departamento de Morfologia para anular o Termo.

- Alguma doação deve ser evitada?
Todas as doações são bem-vindas. Nenhum tipo de enfermidade ou tratamento torna-se impedimento para o cadáver se tornar alvo de estudo. Mesmo os corpos dos cidadãos que passaram por cirurgia e já não possuem parte de algum dos órgãos podem ser doados. “Este tipo de situação pode, inclusive, auxiliar no processo de ensino”, reforça o coordenador da campanha. Afinal, é através do conhecimento da anatomia humana que os profissionais estarão preparados, por exemplo, para fechar diagnósticos com apoio de exames de imagem, como raios X, tomografia e ressonância magnética. Sem falar na alta relevância da disciplina para formação de cirurgiões.

Mais informações
Telefone: (53) 3310-1808
* E-mails: [email protected] e [email protected]
* Endereço: a Famed fica na avenida Duque de Caxias, 250, no bairro Fragata