Editorial

A falência do poder público

Era madrugada de quarta para quinta-feira quando mensagens começaram a chegar ao celular da reportagem do Diário Popular com áudios, fotos e textos de moradores das ruas Dom Pedro II, Gonçalves Chaves e Santa Cruz, no Centro de Pelotas. Os relatos traziam mais do mesmo: som alto de carros com porta-malas abertos, motos acelerando, gritaria. Cenário que torna impossível para qualquer pessoa ter uma noite de sono e descanso para retomar as jornadas de trabalho e estudo no dia seguinte.

Em condições normais, não deveria ser o telefone de um repórter do Jornal a tocar no meio da noite com pedidos de ajuda. No entanto, as mensagens que misturam impotência, indignação e até choro de desespero diante de janelas que tremem dentro de casa pelo barulho chegam ao DP por uma razão: estes pelotenses constatam não ter mais a quem recorrer. Sentem que procurar a Brigada Militar, a Guarda Municipal ou a Prefeitura tornou-se perda de tempo. Relatam ouvirem respostas parecidas com aquelas citadas na reportagem publicada na sexta-feira, de que não há nada a ser feito diante de tanta gente nas ruas. Seria, dizem as autoridades, um ambiente inseguro para uma intervenção.

Somam-se a isso, ainda, as explicações oficiais do poder público a cada vez questionamento. O protocolo tem sido responder à população com alegações que variam entre o "não recebemos chamados", a apresentação de números de operações integradas e abordagens, até a mais recente declaração, do secretário de Segurança Pública do Município, de que "não existe toque de recolher no Brasil, não existe legislação que proíba que as pessoas circulem ou permaneçam em via pública" e que "não existe a perturbação por veículo e motocicletas".

Quanto à última frase, vídeo publicado no site do DP, com um carro com som em alto volume naquela região central, mostra o contrário. Sobre o toque de recolher, de fato tem razão o secretário. No entanto, não é disso que se trata a reclamação dos moradores em diferentes pontos da cidade. Ninguém pede o fechamento de bares ou proibição de circulação de pessoas. Pedem, sim, o cumprimento do que já existe enquanto norma. Como, por exemplo, o bem antigo e válido até hoje Decreto-Lei 3.688, de 1941, conhecido como Lei das Contravenções Penais. Segundo ele, perturbar com gritaria ou abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos pode resultar em multa ou prisão de 15 dias a três meses. Há, ainda, o Código de Trânsito Brasileiro, que define como penalidades para o som alto nos veículos uma multa, pontos na CNH e retenção do veículo. Ou seja, quem convive com o transtorno pede, pelo menos, a fiscalização para garantia de e da legislação.

Ao não cumprir sua tarefa, especialmente negando problema conhecido de todos (e fartamente registrado em vídeos) ou alegando não ter como fiscalizar, o poder público dá recado de falência diante de sua atribuições. E, no fim das contas, o pelotense precisa recorrer mais uma vez à imprensa para ser ouvido.

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Anterior

O IPE Saúde e a base do funcionalismo

Próximo

Quem vai peitar os sites de apostas?

Deixe seu comentário